O desenvolvimento da “internet das coisas” e a proliferação de objetos conectados multiplicam a quantidade de todo o tipo de dedos-duros que nos rodeiam. Nos Estados Unidos, por exemplo, a empresa eletrônica Vizio, sediada em Irvine (California), fabricante de televisões inteligentes conectadas a internet, revelou recentemente que seus aparelhos espionavam seus usuários através de dispositivos tecnológicos incorporados aos produtos.
Essas TVs gravam tudo o que seus espectadores consomem em matéria de programas audiovisuais: os programas em canais a cabo, o que é assistido em DVD, os pacotes de acesso a internet ou até mesmo os games…Dessa maneira, a Vizio pode saber tudo sobre o que seus clientes preferem em matéria de lazer audiovisual….
A julgar pela denúncia apresentada, em agosto de 2015, pelo deputado californiano Mike Gatto contra a sul-coreana Samsung, parece que não. A empresa foi acusada de também equipar seus novos televisores com um microfone oculto, capaz de gravar as conversas dos telespectadores, sem que estes soubessem, e de transmiti-las a terceiros. (3)
Mike Gatto, que preside a Comissão de Proteção ao Consumidor e da Privacidade na Câmara Estadual, apresentou um proposta de lei proibindo que televisões espionassem as pessoas.
De maneira contrária, Jim Dempsey, diretor do centro de Direito e Tecnologias, na Universidade da California, acredita que os televisores-espiões irão proliferar: “A tecnologia permitirá analisar os comportamentos das pessoas. E isso não será interessante apenas para os publicitários. Também permitirá avaliações psicológicas ou culturais, que, por exemplo, interessarão também às companhias de seguro”.
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Sobretudo, se se considera que as empresas de recursos humanos e de trabalhos temporários já utilizam sistemas de análise de voz para estabelecer um diagnóstico psicológico imediato das pessoas que lhes telefonam em busca de emprego….
Isso sem falar dos novos de chips de identificação por radiofrequência (RFID, sigla em inglês), que, automaticamente, descobrem nosso perfil de consumo, assim como fazem os “cartões de fidelidade” que a maioria dos grandes supermercados e grandes marcas oferecem de maneira generosa….
Por exemplo, o portal Yahoo!, que cerca de 800 milhões de pessoas consultam regular e constantemente, captura uma média de 2.500 rotinas de cada um de seus usuários por mês.
Já o Google, cujo número de usuários é maior que 1 bilhão, dispõe de um impressionante número de sensores para espionar o comportamento de cada usuário: o buscador Google Search, por exemplo, permite saber onde o internauta se encontra, o que ele busca e em que momento.
O navegador Google Chrome, um mega-dedo-duro, envia diretamente para a Alphabet (a empresa matriz do Google) tudo o que o usuário faz quando navega na internet.
O Google Analytics elabora estatísticas muito precisas sobre a navegação dos usuários na rede.
O Google Plus recolhe informações complementárias e as mescla. O Gmail analisa a correspondência trocada – o que revela muito sobre o remetente e seus contatos. O serviço DNS (Sistema de Nome de Domínio) do Google analisa os sites visitados.
O YouTube, o serviço de vídeos mais visitados do mundo, que também pertence a Google – e portanto, à Alphabet – registra tudo o que fazemos em seu interior.
O Google Maps identifica o lugar em que nos encontramos, para onde vamos, quando e por qual itinerário… AdWords sabe o que queremos vender ou promover.
E desde o momento em que ligamos um smartphone que opera com Android, o Google sabe imediatamente onde estamos e o que estamos fazendo.
Ninguém nos obriga a utilizar o Google, mas quando o fazemos, eles sabem tudo sobre nós. E, segundo Julian Assange, imediatamente informa as autoridades dos Estados Unidos.
Em outras ocasiões, os que espionam e rastreiam nossos movimentos são sistemas dissimulados ou camuflados, semelhantes aos radares nas avenidas, os drones ou as câmeras de vigilância (também chamadas de “videoproteção”).
Esse tipo de câmera tem se proliferado tanto que, por exemplo, no Reino Unido – onde existem mais de 4 milhões dela, uma para 15 habitantes – um pedestre pode ser filmado em Londres até 300 vezes ao dia.
E as câmeras de última geração, com a Gigapan, de altíssima definição (mais de um bilhão de pixels) permitem obter, com apenas uma fotografia e através de um poderoso zoom que entra na própria fotografia – a ficha biométrica do rosto de cada uma das milhares de pessoas presentes em um estádio, um comício ou uma manifestação política.
(Trechos extraídos de artigo de Ignacio Ramonet, publicado em www.cartacapital.com.br, com título “o novo estado da vigilância e a internet das coisas)