De repente é Natal! E todos viram bonzinhos. Tornam-se cristãos. Até o Cristo é lembrado em meio a tantas mensagens desbotadas. De repente é Natal. Algumas pessoas sentem um frêmito na alma e resolvem fazer o bem, mesmo que dure apenas um dia ou dois. Sorrisos, esmolas, o capitalista mais selvagem é capaz de arriar dois dedos do vidro do seu carro para jogar uma moeda ao menino sem Deus. De repente é Natal e o menino Deus se esqueceu do menino sem Deus.
Hão de dizer que ele não esqueceu, mas é uma questão de Alzheimer celestial. Esqueceu sim. Ou então os estúpidos adoradores de Deus, da pátria e da família têm razão. Aqueles pobres que vivem nas ruas pedindo estão lá porque não querem trabalhar. São vagabundos profissionais, que depois se tornarão ladrões, assassinos, estupradores e bandidos. Mas os homens de bens se tornarão políticos ou votarão em políticos de bens que, de repente, se tornarão maus. E os homens de bem irão bater botas nas ruas, num carnaval fora de época, com gente dopada de ignorância histórica.
De repente é Natal. Ah, quanto faz falta minha mãezinha sorrindo, enfeitando a árvore de Natal e se aprontando para ir ao terreiro de Umbanda saudar Jesus Cristo. “Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo”, diz a mãe de santo. “Para sempre seja louvado”, repetiam os filhos banidos de Deus. E o trajeto até o terreiro está repleto, aos olhos dos homens de bem, de pessoas potencialmente prontas para se tornarem bandidos, banidos da sociedade do papai Noel.
De repente é Natal. Idosos gordos deixam a barba crescer para representarem o obeso símbolo do Natal capitalista. Ho-ho-ho-ho. Nunca entendi essa frase debilmente dita pelo papai Noel. De repente é Natal, hora de praticar o bem, afinal, se não fosse o Natal já teríamos extinguido essa humanidade hipócrita.