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A REVISTA “CHICLETE COM BANANA”

No ano de 1985, com o fim da ditadura militar, o Brasil passou a viver um novo cenário político, período que a história coloca como a “Nova República”. Tinha início a transição entre o encerramento dos “anos de chumbo” e a redemocratização. Cartunistas talentosos decidiram lançar uma revista em quadrinhos “underground”, com edições bimestrais, caracterizada por um humor crítico e irreverente. Angeli, Glauco, Laerte e Luiz Gê, foram os idealizadores dessa publicação, tendo como editor Toninho Mendes. O título ¨Chiclete com Banana¨, foi inspirado na música homônima, composta por Gordurinha e Almira Castilho, gravada por Jackson do Pandeiro em 1950 e regravada em 1972 por Gilberto Gil.

Em outubro de 1985 ela chegou às bancas de jornais e revistas do país, explorando temas como política, cultura e sociedade. Aquela nova geração de cartunistas, ao perceber as contradições da época, buscou confrontar-se com uma elite conservadora que se mostrava avessa às mudanças de costumes e comportamento, dificultando o processo da redemocratização. Foram criados personagens que expressavam o espírito contestador do momento. Dentre eles, Bob Cuspe, Rê Bordosa, Wood & Stock, Meia Oito e os Skrotinhos. Outros personagens denominados “Orgasmo, um sujeito precoce” e a ninfomaníaca “doutora Mara-Tara”, demonstravam o espaço que o corpo e o sexo ocupavam nas páginas da revista, além do comunista “Nanico”, onde consta a afirmação de uma “excitante tortura” a que fora submetido durante a ditadura militar.

Durante seu tempo de existência publicou 24 edições, até o ano de 1990, quando encerrou suas atividades, chegando a vender 130 mil exemplares numa só edição. Seu conteúdo eclético diferenciava das outras revistas existentes, misturando textos e quadrinhos, em suas 52 páginas, impressas em papel off-set, tamanho ofício. Seus colaboradores não eram, exclusivamente, os quadrinistas que a lançaram, mas contava com a participação de autores convidados, versando sobre assuntos que fugiam ao convencional, tais como a qualidade dos chicletes, os banheiros sujos, a má qualidade da comida enlatada, etc.

Bob Cuspe, seu personagem mais destacado, era um punk indignado com o sistema, que perambulava pelas ruas de um grande centro urbano cuspindo em qualquer um que encontrasse pela frente. Sem laços familiares e vivendo numa sociedade de consumo, convivia com o caos das metrópoles, engarrafamento, lixo em toda parte e a fome. Na capa de uma de suas edições, o personagem aparece como candidato numa disputa eleitoral, tendo como slogans de campanha: “Cuspa no prato que comeu” e “Escarra Brasil”. Era uma forma de ridicularizar o processo político que estava sendo projetado para a redemocratização, ainda que estivéssemos na euforia de ver por encerrado o regime de exceção instaurado a partir do golpe de 1964.

Era essa, então, a forma como os quadrinistas fundadores da revista, através do discurso humorístico, procuravam tematizar, através de fantasias, os desejos de transformação presentes no público jovem e como as forças contraculturais agiam no período. “Chiclete com Banana”, a exemplo do Pasquim, nos anos 70, se constituiu como uma das principais publicações de humor do país, refletindo a inquietação e ceticismo reinantes na juventude quanto aos caminhos a serem percorridos no processo da redemocratização.

Rui Leitão

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