Montesquieu teria feito a divisão dos poderes em quatro, se, no seu tempo, lhe tivesse sido possível ver, como hoje vemos, os meios de comunicação de massa conduzindo o processo político-institucional, sobrepondo-se aos outros três. Talvez até em cinco se pudesse intuir a influência sobre os três poderes que ganhou uma entidade a que se convencionou chamar “mercado”.
Executivo, Legislativo e Judiciário enfraqueceram-se. E enfraqueceram-se porque enfraqueceram a Democracia e a Constituição, na medida em que afastaram-se muito, quase completamente, das necessidades e desejos da fonte de poder, o povo. Uma eleição foi, em seus efeitos práticos, anulada. Os membros do Parlamento votam conscientemente e abertamente contra a vontade popular. O Judiciário amarrou seu destino nas circunstâncias e conveniências, parece ignorar a letra da lei e ter esquecido o seu espírito.
Num momento em que há um deserto de lideranças, e as lideranças remanescentes são justa ou injustamente atacadas, no exato momento em que os três poderes estão acossados por encrencas de todo tipo, no instante em que a maioria da população se sente ameaçada em conquistas e direitos recentes ou não, um vapt-vupt derruba o presidente radioativo (sim, onde ele pôs as mãos há perigosa radioatividade contaminadora). O vazio de poder se instala.
Nesta hora agem os estadistas e os oportunistas. É a exata hora de fazer política. Há que escolher entre princípios e interesses, entre circunstâncias e valores, há que negociar no campo aberto pela crise entre a legalidade e a legitimidade, entre o sonhado e o possível.
Do jeito que todo o edifício econômico se apoia na confiança, toda a vida política se apoia na legitimidade, cuja fonte primária é a vontade popular. Hoje é hora de buscar a estabilidade e a legitimidade perdidas. Hoje é o amanhã que se abre. A crise é parteira. O vazio de poder é impossível.
Que os três poderes instituídos busquem alimentar-se da energia da vontade popular e se legitimem na volta à legitimidade originária.
Que a imprensa e o mercado tenham juízo, que leiam e reflitam corretamente a situação e colaborem com o bem maior. Se não por razões altruístas, que o façam em defesa de seus próprios interesses.
A hora é de incluir e conciliar.