Arnaldo Santos
Jornalista, sociólogo e doutor em Ciências Políticas.
Desde a última terceira feira, quando o mundo assistiu a patética apresentação da Opera Bufa bolsonariana, encenada pelo desfile de blindados, tanques, e lançadores pela esplanada dos Ministérios, tendo o Palácio do Planalto como picadeiro para exibição do primeiro ato, simbolizado pela entrega de um tal convite ao bufão presidente, para participar de um exercício militar, fomos agraciados pela imprensa internacional com o depreciativo título de República de bananas.
A vergonhosa e ameaçadora cena do primeiro ato foi dirigida pelo mentiroso comandante da Marinha, que sem nenhuma desfaçatez, tentando contra a inteligência coletiva, afirmou que o horrendo desfile “já estava programado desde o dia 30/03”, e que por tanto, foi mera coincidência ser no dia da votação da PEC, do voto impresso pela Câmara dos deputados.
É consabido que o conceito República de Bananas, além de pejorativo, é aplicado para designar um Estado, em geral latino-americano, politicamente instável, dependente economicamente, gerido por um governo corrupto, e elitista. Governos com esse perfil também são encontrados em algumas pequenas Repúblicas, no continente africano.
Por essas bandas dos trópicos e confirmando tal perfil, temos a engenharia de corrupção montada para a compra vacinas, que a CPI da Covid revelou. Cabo da polícia militar e generais do exército estavam envolvidos. Até pastores evangélicos que choram lágrimas de ‘arrependimento’ diante das câmeras participavam dos negócios escusos, valendo-se do livre trânsito que tinham no Ministério da Saúde. Confirmando o elitismo desse governo, o Ministro da deseducação teve a pachorra de defender que a universidade deve ser ‘para poucos’, quer dizer para elite branca endinheirada. Mais excludente, elitista e preconceituoso impossível.
Em uma republiqueta de bananas o governante faz questão de se subordinar aos interesses dos chefes de Estado de nações ricas, como os Estados Unidos, e tenta demonstrar que tem amizade com esse ou aquele presidente, desde criancinha. Ao mesmo tempo, internamente se julga superior aos demais poderes, xinga e ameaça seus integrantes, especialmente os presidentes do Legislativo e do Judiciário, atentando por todos os meios e de todas as formas contra a democracia, inclusive com tanques e as forças armadas nas ruas. Embora a comparação com o Brasil, possa ser considerada leviana, sob certos aspectos, quando examinamos a realidade política em curso, não é mera coincidência.
Sob o ponto de vista politico-institucional, a demonstração mais eloquente dessa realidade pornô-política foi levada a efeito em grau inimaginável no segundo ato da ópera bufa. No mundo assistiu, na semana em curso, dessa vez tendo como picadeiro a Câmara dos deputados, o presidente daquela Casa, deputado Arthur Lira, rasgar o regimento interno da Câmara, desprezando o parecer da Comissão de Constituição e Justiça, que havia rejeitado a PEC do voto impresso na última semana, por 23 votos contra e apenas 11 a favor, o que regimentalmente encerraria sua tramitação. Entretanto demonstrando toda sua subserviência ao presidente, ainda assim a levou para votação em plenário, sob o falacioso argumento de que acreditava na sua rejeição, o que felizmente se confirmou.
Achando pouco ter passado por cima do regimento, e desrespeitado a vontade da maioria na comissão de constituição e justiça, protagonizou uma ação ainda mais vergonhosa e vexatória, ao ajoelhar-se diante do bufão, protagonista dessa ópera, que está mais para uma pornochanchada, e pelo telefone implorou ao chefe da matilha para que aceitasse o resultado da votação do plenário.
Por tudo isso não é demais afirmar que chegamos ao volume morto da submissão. Lembremos o que ensina o dito popular: quem muito se abaixa o fundo aparece. O presidente da Câmara está com o fundo a mostra para quem quiser ver, pois em nenhum manual da literatura ou da ciência política se encontra qualquer registro, em regime democrático, de um presidente do Poder Legislativo implorar ao chefe do Executivo para aceitar a decisão soberana o povo, deliberada pelos seus representantes.
Nessa perspectiva, examinando a vergonhosa realidade, sob a ótica da teoria da separação, da independência e da harmonia que deve ser guardada e preservada entre os poderes, como preconizado por Montesquieu, forçoso é admitir que em um País onde uma das casas do Congresso, especialmente aquela que representa o povo, tem um presidente que se humilha ao chefe do Poder Executivo merece o termo pejorativo. O lamentável procedimento foi para que o resultado da votação soberana do plenário fosse aceito. É de fato uma república de bananas, por mais lamentável que seja o conceito. Ante a demonstração de “capachismo” do deputado Arthur Lira, não existe melhor definição. Com todo respeito aos produtores dessa saborosa e nutritiva fruta, depois de sermos considerados párias, agora também somos apenas uma republiqueta de bananas, com o agravante de que as bananas estão podres. Leia-se: uma parcela substantiva da elite política apodreceu.
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