SOBRE COLONIALISMO E MASSACRE OU POR QUE ME TORNEI DECOLONIAL? – Carlos Gildemar Pontes

Muita gente fala hoje sobre coisas que nunca leu. Parece ser um fenômeno da bestificação a que estamos sendo submetidos pela indústria cultural, há anos. Primeiro, vem a posse do que é popular para transformá-lo em cultura de massa. Quanto mais gente consumir o que foi popularizado num segmento social, mais renderá para quem explora. E, nesse afã de gerar mais consumo, a própria elite econômica é abocanhada pelo consumo desta cultura sem cultivo.

Com o tempo, a era digital aperfeiçoou as técnicas de manipulação e alcançou rapidamente milhões, bilhões de usuários através das redes sociais, na internet. Incontáveis vídeos se sobrepõem e vão classificando você num algoritmo que produz efeito circular em referentes que trazem mensagens subliminares para alcançarem a finalidade do consumo. Quem já viu a cena talvez não perceba, mas o usuário está sendo transformado num cachorro correndo atrás do próprio rabo.
Este colonialismo fruto dessa relação exposta acima é cultural e apoiado pelas mídias sociais e pelas redes de TV. Muitas vezes, alguém “estoura” no aplicativo de criação de vídeos e, logo depois, aparece na TV, contracenando com os apresentadores e alguns artistas famosos. Esse colonialismo é o que transforma você numa peça de engrenagem social para justificar posturas e comportamentos. Tudo que é feito nesta direção gera lucros fabulosos. O que importa é a fama ou a ilusão da fama acima das necessidades de sobrevivência por alguns minutos de exposição pública.

Mas o que isso tem a ver com massacre?

Os judeus, massacrados pelo nazismo, foram convencidos de que a história dos seus conflitos milenares teria um fim, caso escapassem do trauma do holocausto, com a reunião de todos, ocupando como um direito de posse, aquilo que foi tramado pelas nações europeias no controle da nova ordem mundial pós-guerra. Portanto, para eles, judeus, a terra Palestina é um direito. E ao palestino, povo originário e que luta pelo que é seu, deveria rever sua identidade e se submeter ao novo mapa geográfico que estaria sob o controle de Israel.

Sugiro que vejam o filme “1492 – A conquista do paraíso”, e comparem especialmente a cena em que Colombo conversa com o chefe da tribo, que lhe pergunta o porquê de eles estarem ali na terra dos índios. Colombo responde: para trazer medicina, Deus, lei, ordem… O cacique diz que eles já têm tudo isso. Mas Colombo insiste que virão assim mesmo. E o chefe pergunta: Quantos? Colombo olha para um arvoredo imenso e diz: tantos quantos são as folhas destas árvores. Ali o diálogo se encerra e o cacique vai embora.

Assistam também a Série “Inferno sobre trilhos”, sobre a expansão da ferrovia nos Estados Unidos. Ocorre o mesmo diálogo entre um senador, o chefe da ferrovia e um chefe indígena. Tentam convencer o índio de que eles têm que sair dali, para a ferrovia passar. O índio responde que tem outros lugares para eles construírem a ferrovia. Mas o senador insiste que aos índios será doada uma reserva para eles morarem. E o chefe indígena diz que não pode receber o que já é deles.

Assista também “Fronteiras”, sobre a colonização e exploração de peles de animais pelos ingleses, no Canadá. O tratamento que os ingleses dão aos nativos é o mesmo de Colombo, da coroa portuguesa, da coroa espanhola, dos franceses e hoje dos americanos do norte com relação aos outros países. Todos que não são brancos, cristãos e capitalistas são bárbaros. Essa lição está na História e está aqui mesmo, entre nós. Um bando de milicos sem inteligência intelectual e sem humanidade, governado por um psicopata, querendo dar um golpe para poder ter prótese peniana, comer caviar e matar quando precisar, usando os idiotas inúteis e os empresários antipatriotas para desestabilizarem o país. Quem de direita não se enquadrar neste rol exposto aqui sinta-se apenas cúmplice e faça mea culpa.

A Palestina é só mais um país colonizado brutalmente por Israel, governado por uma extrema direita com ares de perversidade comparável ao que fizeram a eles na Segunda Guerra Mundial.

Então, eu pergunto: Somos assim? Não, não somos assim. Fomos adestrados para sermos assim. Eu me recuso. Tenho opção de ser diferente, divergente e decolonial.

Qualquer sistema que esteja ao lado de um massacre eu serei contra. O Hamas matou cerca de 250 inocentes. Israel, em retaliação, matou 2.500 palestinos inocentes. Não se sabe se matou humanistas. Que balança pode ser usada para pesar 250 com 2.500? O colonialismo israelense não se importa com a vida dos palestinos.

Qualquer colonialismo não se importa se são índios, negros, gays, putas, árabes-palestinos, sulamericanos… Eu jamais estarei do lado de lá. De quem usa o extermínio sob qualquer que seja a alegação. Fizeram isso com as três Américas e com a África, usando o nome de Deus. Por conta disso, muito cedo, me tornei decolonial.

Carlos Gildemar Pontes

CARLOS GILDEMAR PONTES - Fortaleza–CE. Escritor. Professor de Literatura da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. Doutor e Mestre em Letras UERN. Graduado em Letras UFC. Membro da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Foi traduzido para o espanhol e publicado em Cuba nas Revistas Bohemia e Antenas. Tem 26 livros publicados, dentre os quais Metafísica das partes, 1991 – Poesia; O olhar de Narciso. (Prêmio Ceará de Literatura), 1995 – Poesia; O silêncio, 1996. (Infantil); A miragem do espelho, 1998. (Prêmio Novos Autores Paraibanos) – Conto; Super Dicionário de Cearensês, 2000; Os gestos do amor, 2004 – Poesia (Indicado para o Prêmio Portugal Telecom, 2005); Seres ordinários: o anão e outros pobres diabos na literatura, 2014; Poesia na bagagem, 2018; Crítica da razão mestiça, 2021, dentre outros. Editor da Revista de Estudos Decoloniais da UFCG/CNPQ. Vencedor de Prêmios Literários nacionais. Contato: [email protected]

Mais do autor