Se Eu Fosse Uma Escritora, por LUANA MONTEIRO

Ao analisar bem as projeções para o futuro, noto a presença persistente de sonhos a serem realizados. A maioria deles representa também novos desafios a serem vivenciados e enfrentados. Mas, e se tudo pudesse ser diferente? Será que eu me preocuparia tanto com o futuro?

E se eu fosse uma escritora, como solucionaria minhas preocupações? Eu acho que buscaria antes de tudo reinventar as relações. Eu desenharia novos destinos desde cedo de meninas e meninos.

Para que tanta diferença no mundo? Estou sempre a me questionar. A vida seria tão mais bonita e simples se os objetivos centrais fossem realmente viver, amar e ser feliz. Veja que caminhada mais linda seria se a única coisa que buscássemos fosse alcançar a felicidade! Mas o tipo de felicidade de que eu falo não é aquele que se procura em uma loja e toma-se posse. A felicidade da qual eu falo não emana das coisas, mas das relações. Para ser feliz não é necessário mediação, e sim vivências diretas.

Se eu fosse escritora, eu não me contentaria com pouco. Eu recriaria as palavras. Eu editaria as canções. Eu faria histórias mágicas capazes de nos tirar o fôlego e nos carregar para outros mundos. Eu instituiria o conceito de “palavra-passaporte”. Com ela, sempre que requisitássemos, viajaríamos para outros horizontes em poucas linhas de escrita e leitura.

Se eu fosse escritora eu amaria os erros. Eu seria amiga da imperfeição. Eu buscaria sempre a companhia da incerteza. Porque só assim eu saberia que estaria no caminho da mudança, da transformação.

Como o filhote de albatroz que vive a simplicidade do hoje e entende o mundo no voo das longas assas de seus pais ao pousarem com alimento em seus bicos. Ao passar dos meses a frequência com que os vê já não é mais a mesma, até perceber que eles não voltarão. Um novo mundo se abre para a jovem ave que começa a entender que precisa ela também alçar longos voos. De um passo a outro a ave se arrisca e descobre as próprias asas. Seu percurso de vida foi tão desafiador e ao mesmo tempo tão engrandecedor que lhe possibilitou adquirir nova forma para percorrer sua jornada de existência.

A felicidade de corrigir um erro e tentar outra vez preencheria meu coração.

Não fugiria das críticas e nem temeria expressar minhas emoções. Seria feliz pelo simples fato de construir uma frase com motivo e inspiração. O sentido poderia derivar de qualquer explicação. O sentido da criação seria a sua própria vontade de existência.

Não me prenderia à ditadura do novo, nem do exótico. Respeitaria meu desejo. Deixaria a lógica maquinal heterônoma para os que perseguem uma vida frenética e não humana. Eu não, eu seguiria somente a lógica dos meus sentimentos.

Teria a certeza da concretude das palavras. Estas seriam minhas roupas, meu alimento, minha companhia e minha expressão. Eu as vestiria com simplicidade e paixão. Carregaria no corpo somente as que caíssem delicadamente sobre minha pele. Buscaria a leveza e transparência das suas expressões. Se assemelhariam a um robe bem fino que, por mais que vestisse, ainda assim manteria meu corpo desnudo. Assim também me expressaria ao fazer uso das palavras, utilizaria cada uma com delicadeza e limpidez. Nunca para me esconder, sempre para expressar o mais íntimo que há em mim. 

Mas nada disso é certeza. Talvez sejam somente sonhos ou ilusão. Sou uma simples amante da razão. Um dia quem sabe serei pureza amiga da certeza e da indecisão. Hoje sou apenas sonhadora, sonhando mais um voo para dentro de mim.

Luana Monteiro

Cientista social, mestre em Sociologia (UECE) e pesquisadora.

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Luana Monteiro

Cientista social, mestre em Sociologia (UECE) e pesquisadora.