Rústico

“Penny for a poor old man, penny for a poor old man!” Rústico. “Espanquem os pobres”, pois a mendicância é uma fraqueza de espírito. Darwinismo nas telas, como nas ruas. Luta pela sobrevivência nua e crua, fonte primária. Asas prontas para o voo e, no entanto, se retrocede. Ora, que vento sopra sobre as asas do anjo?Sopro infalível que faz qualquer marinheiro perder o curso de sua casa!

– “Penny for a poor old man, penny for a poor old man!”  

Três metros por três metros, Clov. E o que seria de Hamm sem Clov, e o que seria do senhor sem seu servo, sem seu escravo. Ainda não saímos da luta pelo reconhecimento, da luta pela sobrevivência, ainda não deixamos de querer ocupar as máscaras de ferro e ao intelectual como ao crítico como ao pastor e o bispo e o diplomata e todos aqueles que seguem seriamente sua rotina há um gosto acre de algum desejo mal resolvido. Para eles, psicoterapeutas; ao anjo melancólico, fragmentos de ruína se amontoam diante de seus olhos e ele não pode, sozinho, catar fragmentos, convidar os mortos à mesa, ao banquete preparado desde o início dos tempos.

– “Penny for a poor old man, penny for a poor oldman!”  

Um violino distorcido, dissonante, terrível, nenhuma beleza na cidade em ruínas e um cadeirante arrogante como inútil – companheiros de infortúnio. Três metros por três metros. Andar cambaleante até a janela em que se pode ainda ver uma natureza morta, mas ainda assim natureza: o que resta após o devastamento da Floresta pelo fogo e do homem pela peste. Era esse o projeto humanista? Era essa a promessa da felicidade científica? Dependo de você tanto quanto o senhor depende de mim, dialética de senhor e escravo por reconhecimento. De que adiantam as peles se a máscara não muda, todos a querem, darão seu máximo impulso vital para vesti-la sendo que o paraíso, Tântalo, está ao alcance das mãos e não há mal algum em querer saber alguma coisa sobre isto tudo que nos rodeia – parece apenas um tanto desgostoso perceber-se máquina, ainda que funcione bastante bem.

– “Penny for a poor old man, penny for a poor oldman!”  

Pedro Henrique

"Anota aí: eu sou ninguém"

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