Comecei a escrever uma prosa extensa. Chamam isso, no ocidente contemporâneo, de romance. Escrevo. Feito qualquer outro trabalhador é provável que eu preferisse fazer nada. A rede é minha própria aranha amorosa: quero comer teu corpo cozido no teu leite, ela me diz. E penso no meu leite de palavras, cada vez mais ralo. Tudo que eu queria era gritar ao mar um desafio que também dissesse nada. Qualquer pessoa que tenha se debruçado sobre o papel em busca de palavras sabe o que sinto agora. As unhas do querer, muito aliás, rasgam a água leitosa do papel. Mas não é aqui que cabem as confissões de amor e ódio. Onde então? O nome de Deus permanece interditado. Os faladores do nome de Deus permanecem interditados. Deus mesmo não se pronuncia: só tem costas para isso: é um animal de dois avessos feito apenas de si mesmo. Fulmina-me com um raio, eu digo, e ele, ai, nem ri. Comecei a escrever uma prosa extensa. Chamam isso de romance no ocidente contemporâneo.
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