[Exercícios sobre Poder e Autoridade na Universidade pública brasileira]
A UFC escapou, desde a sua criação, ao cerco das oligarquias e às futricas locais. Sobreviveu ao “Ceará profundo”, da pobre província de outros tempos. Os reitores, fossem quais fossem as suas filiações políticas, mantiveram o seu poder decisório a salvo dos partidos e da ingerência do governo federal. A UFC foi, por um largo período, espaço poderoso a salvo das tentações oligárquicas sobreviventes.
Salvo o período dos governos militares e as estações de hibernação ideológicas que se seguiram, com a formação de grupos radicais infiltrados no movimento estudantil, o reitor e os conselhos superiores exerciam as suas competências com liberdade e as atribuições acadêmicas e administrativas que lhes eram próprias, com independência.
A ampliação do papel político de que se armaram os “coletivos”, sob o controle de “grupos dominantes”, os departamentos, conselhos departamentais e as coordenações de ensino criaram condições favoráveis para a consolidação de relações de poder marcadas por extraordinária capacidade de pressão exercido sobre a reitoria e os centros legais de decisões da instituição.
Essas fontes de poder paralelo, surgidas dentro da universidade, a partir dos anos 1980, passaram a exercer influência decisiva sobre as decisões setoriais da instituição, além do exercício de forte influência sobre poder de negociação, em nível dos colegiados superiores e da própria reitoria.
Como desdobramento desse processo de revisão de precedências e atribuições no plano do governo universitário, a “Autonomia Universitaria”, inscrita como princípio
constitucional, foi gravemente ferida e fragilizada.
Externamente, a redução da capacidade de auto-regulação em assuntos internos, foi enfraquecida com a ampliação da interferência do Ministério da Educação na administração da Universidade.
O MEC, desde a sua criação, durante o ESTADO NOVO, recorreu ao emprego de controles que fixam os enormes poderes, ainda hoje concentrados naquela pasta. Capanema deu-lhe confirmação e objetivos colhidos na Itália fascista de Mussolini que seduzia os revolucionários de 30.
Internamente, as competências estatutárias e regimentais da Universidade sofreram evidente mutilação, com a redução das competências executivas da sua administração
No primeiro caso, os recursos de investimento ficaram em grande parte subordinadas ao que especiosamente o MEC designa como “projetos especiais”, cuja aprovação fica sujeita a critérios que atendem a requisitos pouco republicanos e acentuadamente políticos.
No segundo caso, a fragilização das competências do reitor, associada, na prática, ao princípio eleitoreiro da “recondução” do reitor, toma corpo. A luta em favor da permanência do titular para um segundo mandato abre espaço para ampla negociação de favores e privilégios… A reitoria e as lideranças departamentais, mais os “grupos de dominação”, dotados de incontestado poder de articulação, passam a compor-se para acertos de interesses e intenções político-ideológicas.
Em traços sumários, são estes os pressupostos das precedências para o exercício do governo nas universidades públicas. A UFC não se apresenta, de forma convincente, como exceção desse modelo burocrático e concentrador.
Às vésperas do término do primeiro mandato de Dilma Roussef [2014] como presidente da República, os reitores das universidades federais foram, em manifestação solidária de lealdade, levar-lhe o apoio para a sua reeleição. Assinavam “Manifesto”, tipo “baixo-assinado”, que marcaria época na vida da educação brasileira pelo seu caráter subalterno e despropositado.
Estas notas resultam de alguns ensaios que desenvolvi sobre uma pergunta aparentemente ingênua: QUEM MANDA NA UNIVERSIDADE?
À falta de patrocinador e de editor complacente, fui forçado a manter o livro para o meu consumo próprio. Espero aprender alguma coisa comigo mesmo, mercê de uma exaustiva experiência que me foi dado desenvolver, como reitor da UFC, e gestor de uma Universidade privada no Rio de Janeiro. E, quase esquecia, secretário ministerial em duas passagens pelo MEC.