COMO ANUNCIOU EM ALTO E BOM SOM o ministro Ricardo Salles, na reunião dos palavrões, do dia 22 de abril, no Palácio do Planalto, convocando os ministros de Estado a encaminharem leis de desregulamentação e privatização para “passar a boiada” enquanto a opinião pública é distraída pela mídia global com a cobertura da pandemia, ontem, 24 de junho, sob a relatoria do senador Tasso Jereissati, recomendando a aprovação do Projeto de Lei 4.162/2019 sem alterações, facilitando a privatização das estatais do setor, o Senado votou o novo marco legal que autoriza a exploração privada do saneamento básico no Brasil. Sessenta e cinco (65) senadores votaram pela privatização, entre eles os três representantes do estado do Ceará: Cid Gomes (PDT), irmão de Ciro Gomes; Eduardo Girão (Podemos) e Tasso Jereissatti (PSDB). O Partido dos Trabalhadores (PT) foi o único partido a orientar sua bancada de seis senadores pela reprovação do Projeto. Treze votos foram contrários à privatização da água: 06 do PT e 01 voto de cada partido PSB, Cidadania, Republicanos, Rede, PDT, Pros, PSD.
O sistema de abastecimento de água no Brasil é operado a partir do subsídio cruzado. E o que é o subsídio cruzado? Define-se quando uma empresa produtora de bens e serviços faz um equilíbrio nos preços e nas taxas. Em determinadas áreas cobra-se uma tarifa mais elevada para em outras regiões oferecer-se o serviço de forma mais barata em função da baixa demanda relativa de água, quando comparada com os grandes centros, além da desproporcionalidade de renda entre municípios. O superávit nas grandes cidades permite ao sistema de subsídio cruzado propiciar a oferta de água a preços módicos em cidades mais empobrecidas. Ocorre que empresas privadas capitalistas têm como objetivo final dar lucro para o seus acionistas. Dentro de uma distribuição de água desproporcional do ponto de vista da lucratividade, essas empresas privadas só vão mirar os territórios, as cidades e os municípios que lhes gerarem lucro. As regiões que não tiverem condições de garantir lucratividade para esses capitalistas, não vão receber a devida atenção.
Capitalistas só investem em territórios, atividades e comunidades com maior potencial de lucro e de fácil retorno financeiro. O marco legal garantidor de um modelo privatista mira prioritariamente a rentabilidade e não tem nenhum compromisso com a universalização da entrega desse bem essencial à vida das pessoas. É o investimento público a mola mestra de correção das desigualdades sociais e territoriais em nosso país, como já estamos cansados de comprovar. Consequentemente, o novo marco legal consolida um modelo que privilegia o darwinismo social no qual os mais vulneráveis e pobres são os prejudicados. O projeto entre tantas aberrações, cria a figura esdrúxula da “EMPRESA PRODUTORA DE ÁGUA” (sic!). Esta divindade terá o poder de definir o que fazer e como fazer com a água.
A presença ou a ausência da água cria a história. Sem água a vida em nosso planeta não teria nascido. A água é um bem de todos. Mas o capitalismo fez da água um recurso. Os capitalistas olham para a água de uma forma utilitarista buscando lucros. A partir desta visão utilitarista produzema poluição, a contaminação dos corpos d’águas superficiais e subterrâneas, o aumento da escassez da água em determinadas regiões do planeta e uma crise socioambiental profunda pela utilização predatória da água. O aumento da pobreza, da poluição de rios e de aquíferos, derrubada de matas para expansão de agronegócios, ocupação de áreas dos mananciais. Para ficar num exemplo, em regiões como Ribeirão Preto – SP, o Aquífero Guarani vem sofrendo contaminações por agrotóxico e pelo vinhoto pela infiltração no solo das águas das chuvas contaminadas por esses venenos químicos.
Diante da ameaça que essa depredação do uso utilitarista da água oferece, tome-se o fato da pandemia da covid- 19. Sendo a água um bem fundamental para o enfrentamento do vírus, nas comunidades pobres do Brasil ela não existe. Centenas de comunidades só têm acesso a água potável uma vez por semana. Assim, a crise sanitária permite perceber ainda mais as contradições da sociedade brasileira que clama por justiça distributiva.
Nas próximas décadas será decisiva a luta política pela acessibilidade da água como bem universal. O Brasil possui água em abundância, seja em aquíferos, rios e lagos. Sabe-se que a Coca-Cola Company, da qual o senador Jereissati é acionista, e a Nestlè estão de olho para assaltar o Aquífero Guarani, considerado o maior reservatório subterrâneo de água doce do planeta. Quase 70% das águas do Aquífero Guarani estão em subsolo brasileiro. Um Pré-Sal de Água Doce. Água não pode jamais ser reduzida à propriedade privada. Água é um bem da Humanidade. Essa é uma luta de todos pela retomada de nosso Projeto de Nação democrática e soberana, desmantelado pela articulação do bolsonarismo e pauloguedismo juntos. Só para deixar registrado, na GloboNews, os editores desceram o sarrafo no PT por haver votado contra a privatização.