PRÉ-LEITURA DO LIVRO “COM BORGES”, DE ALBERTO MANGUEL

O AUTOR

Alberto Manguel é escritor, tradutor e ensaísta argentino, nascido em 1958. Sua obra mais conhecida, Uma História da Leitura.

A PUBLICAÇÃO

O livro “Com Borges”, de autoria de Alberto Manguel, com 72 páginas, foi publicado em 2020, pela Editora Âyiné.

CIRCUNSTÂNCIAS

Este livro é um relato do autor sobre a experiência de trabalho dele com o escritor Jorge Luís Borges (atingido pela cegueira total aos 58), para quem ele lia e com quem assistia filmes. A convivência longa e rica dos dois e a relação de Borges com livros e outros escritores alimenta e sustenta a obra.

A IMPORTÂNCIA DO LIVRO

Jorge Luis Borges foi um gênio da literatura. Viveu dela, viveu para ela. Produziu textos fantásticos e cheios de encanto. Alberto Manguel teve a oportunidade (o privilégio) de conversar com o gênio e com o homem. E transmite com leveza e elegância a forma de pensar de Borges, fonte de beleza literária e humana, leitura imperdível. Com a obra, Manguel se aproxima e nos aproxima de Borges.

Leia trecho de Manguel: Há escritores que tentam colocar o mundo num livro. Há outros, mais raros, para quem o mundo é um livro, que eles tentam ler para si mesmo e para os outros. Borges é um desses escritores.

O LIVRO

O livro tem o tamanho, a forma e o estilo de um ensaio. Pode ser lido em pouco mais de uma hora. O universo de Borges é belo e infinito. Manguel faz um roteiro cheio de sensibilidade para transmitir o mais revelador, sem uma gota de pieguice, intimidade e distância em boa medida e proporção. Pouca gente pode dizer que leu tanto quanto Borges (e como Manguel), dono de prodigiosa memória. Poucos escrevem como os dois. O livro sugere isso. E mais.

BONS MOMENTOS

“… as conversas com Borges eram, ao contrário, o que, na minha mente, toda conversa deveria ser: sobre livros e seu funcionamento, sobre escritores que eu ainda não tinha lido, sobre ideias que não tinham me ocorrido ou que eu vislumbrara de maneira hesitante, meio que por intuição, e que na voz de Borges reluziam e deslumbravam com todo seu intenso esplendor… eu não tomava notas porque naquelas noites eu me sentia feliz demais.

“… Para Borges, o âmago da realidade estava no estava nos livros: em ler livros, escrever livros, conversar sobre livros. De maneira visceral, ele sabia que dava continuidade a um diálogo iniciado havia milhares de anos, o qual ele acreditava que nunca terminaria. Livros restauravam o passado…

“… Nunca se sentia obrigado a ler um livro até a última página. Sua biblioteca (que, como a de todos os outros leitores, também era sua autobiografia) refletia sua crença no acaso e nas regras da anarquia. “Sou um leitor que busca o prazer: nunca permiti que meu senso de dever influenciasse algo tão pessoal quanto a compra de livros “.

“… com frequência, Borges discutia sua própria cegueira, principalmente com um interesse literário: em um famoso poema, ela lhe aparece como demonstração da “ironia de Deus “ que lhe dera “livros e à noite”; mas também sob o aspecto histórico, como quando lembrava de poetas cegos renomados, como Homero e Milton; ou supersticiosamente, pois foi o terceiro diretor da Biblioteca Nacional a ser acometido pela cegueira…

“… “ Pode anotar isso?” Ele está se referindo às palavras que acabou de compor e decorar. Dita uma por uma, entoando as cadencias que ama e indicando os sinais de pontuação. Recita o novo poema verso a verso, sem seguir o sentido até a estrofe seguinte, mas parando no fim de cada verso. Então pede que leiam pra ele, uma, duas, cinco vezes. Desculpa-se pelo pedido, mas depois pede outra vez, escutando as palavras, visivelmente revirando-as na cabeça. Em seguida acrescenta outra frase, e mais outra…

“… Quando o jovem Mario Vargas Llosa visitou Borges em algum momento em meados dos anos 1950, ele fez uma observação sobre o ambiente de mobília simples e perguntou por que o mestre não morava num lugar mais grandioso, mais luxuoso. Borges se ofendeu imensamente com a observação. “Talvez as coisas sejam assim em Lima“, disse para o indiscreto peruano, “mas aqui em Buenos Aires não gostamos de ostentar “.

CURTAS

“… A cegueira e a velhice era maneiras diferentes de ficar sozinho…

“ Seu mundo era inteiramente verbal: a música, a cor e a forma raramente entrava nele.

“… Gosto de fingir que não sou cego e fico Conversando livros como um homem que consegue enxergar.

“… Borges dizia que era acima de tudo um leitor…

“…Quando o carteiro, a pedido de Borges, descreve um livro que veio entregar, ele diz: “…mas isso não é um livro, é uma caixa de bombons”, e o deu ao carteiro.

“… Era talentoso com paradoxos, com expressões discretas e esclarecedoras, com absurdos elegantes, como em em sua advertência ao sobrinho de cinco anos: “ se você se comportar, eu lhe dou permissão para pensar num urso “.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.