“Just a small town girl
Living in a lonely world
She took the midnight train
Going anywhere…”
O verso acima, somado a apenas quatro acordes em piano e uma letra tão motivadora que é como um soco na cara de quem pensa em desistir de qualquer coisa. É assim que começa Don’t Stop Believin’, canção da banda estadunidense Journey. Um clássico já estabelecido na história do rock e da música pop em geral, é praticamente impossível que algum ser humano não o tenha ouvido pelo menos uma vez na vida. Um hit radiofônico que foi primeiro lugar em praticamente toda parada de sucessos durante anos. Um sucesso de vendas tão absoluto que você deve lembrar de ouvi-lo até mesmo naqueles incansáveis comerciais que vendiam coletâneas de CDs na Rede Manchete (“Ligue já! 011-1406!”), inconscientemente tão grudado na sua memória que inclusive te arrancou uma risadinha agora mesmo e denunciou sua idade em silêncio.
O fato é que tal canção (que, neste momento, você já deve estar procurando ouvir pela internet) é um daqueles fenômenos culturais da música que já não surgem mais de forma tão intensa, tomando seu lugar de honra ao lado de símbolos praticamente imortais da cultura pop moderna. E tenho algumas provas disso:
1) Don’t Stop Believin’ ultrapassou a marca de 4 milhões de downloads pagos somente no ano de 2010*, um período não tão distante. E eu disse downloads PAGOS. Este é um feito que nenhuma outra canção havia conseguido antes do ano em questão. Nenhuma.
2) Seu lugar na cultura pop conquistou novas gerações a partir da versão cantada pela turma do seriado Glee. Nesta época (anos 2000), o hit volta com toda a força e serve para, inclusive, apresentar às gerações Y e Z bandas mais antigas como o Journey.
3) Os quatro acordes de sua simples progressão formam uma cadência harmônica tão “redonda” e cativante que dezenas de artistas dos anos 90/2000 a utilizaram largamente em seus maiores sucessos. Você pode ter uma noção disso com o hilário vídeo do grupo Axis Of Awesome mostrando dezenas de canções que se utilizam exatamente da mesma progressão harmônica.
Assista em: https://www.youtube.com/watch?v=5pidokakU4I.
Até este ponto, acredito que você já deva ter ouvido a canção, relembrado o refrão (que curiosamente surge apenas ao final da música) e até ficado feliz com a vibe positiva que ela transmite. Muito bem, leitor(a), me deixe orgulhoso! Mas agora talvez seja a hora de você conhecer um pouco mais sobre a voz que durante muitos anos esteve à frente da banda, levando sua música e magia para as grandes multidões.

Nascido em 1949 na Califórnia, sendo neto de portugueses dos Açores, Stephen Ray Perry começou sua carreira musical ao se mudar ainda adolescente para Los Angeles. Lá, uma fita de sua antiga banda, Alien Project, chega às mãos de um grande produtor local, que buscava uma nova voz para um projeto inovador com grandes músicos da Costa Oeste americana. O primeiro vocalista não havia se adaptado à banda, que inicialmente tocaria rock progressivo, fusion e jazz. Descoberto pelo produtor Herbie Herbert, o jovem Stephen entra, então, para este time de grandes músicos ao lado de Neal Schon (guitarrista, um prodígio revelado pela banda de Carlos Santana), Ross Valery (baixista), Gregg Rollie (tecladista e cantor) e Aynsley Dunbar (baterista). A formação sólida do Journey nascia ali, bem como mudanças no direcionamento musical da banda. Assim, o grupo começara a mostrar sua força dentro do gênero que viria a ser chamado AOR**. Ao mesmo tempo, “nascia” também a voz que levaria o Journey às grandes plateias: Stephen Ray Perry era agora Steve Perry. Ou, modestamente, “The Voice” (“A Voz”) para seus fãs em todo o mundo. Alcançou o estrelado de forma tão intensa que foi convidado a cantar, anos mais tarde, na famosa We Are The World, de Michael Jackson ao lado de vários outros artistas de sua geração.

Após muitos anos à frente da banda, recordes de público em arenas, estádios lotados e vendas extraordinárias de seus álbuns, Perry deixou a banda ainda no final da década de 1980. Os motivos foram um alegado cansaço, além de desentendimentos e a vontade de investir em sua carreira solo – que teve como resultado os incríveis álbuns “Street Talk” (1984) e o amadurecido “For The Love Of Strange Medicine” dez anos depois. Retorna apenas em 1995 para encerrar sua carreira no Journey com o disco “Trial By Fire” (1996), que rendeu à banda a primeira nomeação ao Grammy Awards em sua história com a emocionante balada When You Love a Woman. Logo depois, quando iria começar a turnê de divulgação deste disco de retorno, Perry sofre um acidente ao escalar uma montanha que lhe rende um sério problema na perna. Optando por fazer um tratamento que o deixaria de fora da agenda do grupo, Perry dá o adeus definitivo ao Journey em 1998, dando vez a novos vocalistas que seguiriam como seus substitutos a partir de então.
Mesmo com sua saída, o legado da voz de Perry ficou para os fãs como um bálsamo eterno, uma referência universal quando se trata de canto popular. O que diferencia seu timbre de tantos outros vocalistas que explodiram em sua época em bandas como Bon Jovi, Guns N’ Roses, Poison, Van Halen e dezenas de outras é justamente aliar alcance vocal à uma emoção e tessitura raramente encontradas. Perry sempre teve algo diferente, que o tirava da mesmice de muitos vocalistas pastiche que apenas se preocupavam em disputar quem cantava mais agudo. Preocupado muito mais em explorar a emoção do que a técnica (que ele também domina muito bem), soube imprimir emoção com maestria, seja na “rouquidão” controlada, na suavidade potente ou na carga emocional que não o deixam soar chato ou meloso demais. O fato é que sua voz é sim diferente, envolvente, forte. Imortal. E é por causa dessa imortalidade que o mundo precisa novamente de sua voz.
Convido você, leitor, a entrar na experiência de descobrir a voz de Perry. Pode fugir de Don’t Stop Believin’ e descobrir músicas “novas”, seja no Journey ou em sua carreira solo. Confira os momentos em que o vocalista brilhou com baladas incrivelmente belas e carregadas de emoção de sua carreira solo como What Was, Anyway, Go Away e It Won’t Be You e até em momentos fortes como, Oh Sherrie (clássico instantâneo nas rádios da época), Stand Up (Before It’s Too Late), Once In a Lifetime Girl e Listen To Your Heart (não é a do Roxette!). Da discografia com o Journey, recomendo as incríveis Mother Father, Faithfully, Open Arms, Forever In Blue, Send Her My Love e I’ll Be Alright Without You. Perry também demonstra no Journey todo seu lado roqueiro no alcance de notas agudas em petardos como Wheel In The Sky, Separate Ways, Stone In Love, Girl Can’t Help It e na animadíssima Any Way You Want It.
Fãs (incondicionais, como eu – se é que deu pra perceber) ao redor do mundo ainda aguardam que Perry lance algum material inédito assim que possível. Infelizmente, o cantor é muito recluso, não dá entrevistas e só costuma aparecer em público quando flagrado frequentemente na plateia dos jogos do San Francisco Giants, seu time de beisebol favorito. Venceu um princípio de câncer de pele em 2013 e, no ano anterior, sofreu a perda de sua namorada Kelly Nash também para um câncer. Após sua saída do Journey, Perry fez algumas participações em projetos de outros artistas, mas nunca mais gravou nada inédito. Porém, 2014 foi um ano feliz tanto para ele quanto para alguns sortudos fãs: o cantor subiu aos palcos novamente após mais de 20 anos! Em participação especial de um show da banda EELS, Steve cantou algumas músicas e, entre elas, Lovin’, Touchin’, Squeezin’ e Open Arms, dois grandes sucessos de sua antiga banda.

Enquanto os fãs ainda alimentam uma vaga esperança de que Perry volte à ativa em carreira solo (ou mesmo numa improvável reunião com o Journey), os garotos de São Francisco continuam como uma legítima entidade do rock para os norte-americanos. Prova disto é que até hoje o Journey é cultuado em sua formação atual, que ainda carrega membros de sua formação clássica ao lado de alguns estreantes como o vocalista atual, o filipino Arnel Pineda. A banda é tão respeitada que suas turnês norte-americanas ainda são recordes de audiência. Eles também são sempre chamados para executar o hino nacional dos EUA em alguns jogos de beisebol pelo país afora.
Para aumentar a aura de mistério que cerca o cantor, em poucas entrevistas recentes ele declarou que já possui diversas novas composições para lançar. Quando, ainda não sabemos. Mas esperamos ansiosos pelo retorno deste artista tão único, que sempre emociona e transporta coração e ouvidos por grandes jornadas sonoras.
Porque sim, o mundo precisa da voz de Steve Perry outra vez.
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*Segundo matéria do site observer.com/2015/08/lose-yourself-is-the-most-timeless-song-on-spotify/ (em inglês)
**AOR seria traduzido como Album-Oriented Rock (Rock Orientado para o Álbum), uma denominação para um tipo de hard rock menos popular e bem melhor trabalhado.
Respostas de 14
Meu cantor favorito sem dúvida. A música If Only for The Moment é simplesmente maravilhosa. Sempre fico feliz em ler algo a respeito de Steve Perry, ele e muito especial😍Obrigada foi muito interessante.
Conheci o Steve Perry há pouco tempo…sinceramente,não sei por onde andei nos anos 80 onde foi o sucesso do journey… só sei que amo demais a voz e a música do Steve Perry.. gostaria de saber muito mais sobre ele e torço para que ele volte a nos alegrar com suas músicas…eu preciso muito ouvi lo agora! Amo amo Amo Steve Perry!!😍
Amo de paixão journey de Steve Perry acho q ele ele era a banda e torço pra q ele volte com seu encanto e voz divina, sem palavras, sempre Steve Perry……..
Sou muito fã de Steve perry amo todas as músicas dele
Pois é, Anne. E ele prometeu músicas novas pra este ano ainda, mas parece que até agora não saiu nada. Ansiedade me define! :(
Olá meu nome é Ivo, sou fã incondicional do Journey e principalmente do vocalista Steve Perry. Gostaria de saber o que aconteceu com a voz dele, que no show com EEls e canta as músicas nos tons mais baixos? Valeu!
Confesso q tamém sou uma fã INCONDICIONAL deste astro, e amante porque p colocar tanto sentido às músicas como Perry fazia só sendo um completo e perfeito romântico. Estou ânciosa para ver novas músicas e tenho procurado notícias a este respeito. Amei o relato q foi escrito acima Sérgio você está de parabéns.
Eu amo STEVE PERRY, e sim NÓS PRECISAMOS DA VOZ de PERRY.
Steve Perry, uma pérola do rock, uma pérola para o rock. Little Girl e Good Morning Girl, prestem atenção nessas músicas, perfeitas. Interpretações invejáveis, impecáveis e emocionantes!!!!
É isso mesmo, Rafael. Perry é uma raridade, uma voz inigualável! Tô ansioso pra ele realmente lançar o prometido álbum novo este ano. Fica ligado aqui na coluna pra mais novidades. Se você gostou dos textos, espalha pros seus amigos também. A cada 15 dias tem novidade. Abraço e obrigado! :)
ATUALIZANDO: excelente notícia – Perry CONFIRMA que está EM ESTÚDIO gravando material inédito. Espera que seja lançado ainda na primeira metade de 2016. Glória!!!! :)
http://ultimateclassicrock.com/steve-perry-solo-album-plans/?trackback=fbshare_top_flat_3
Sérgio, belo trabalho! Seria simplesmente espetacular poder receber a dádiva de canções inéditas na voz do Mestre! Parabéns! Keep it up!
Valeu, grande Mario! Fica ligado que tá sempre tendo textos novos aqui na coluna, geralmente quinze em quinze dias. Dá uma sacada nos anteriores. Sempre comento sobre música em geral e indico alguns artistas que curto. O objetivo é sempre refletir sobre a música em nossas vidas. Se tiver alguma sugestão, manda também. Abração! Keep on runnin’ :)
1981 o ano que fiz intercâmbio para estudar nos Estados Unidos, com 17 anos de idade fui morar por um tempo na cidade de Savannah no estado da Georgia, chegando lá, logo descobri duas rádios Rock que existiam na cidade a 95SDF e a Z102, 24 horas de rock direto, foi ouvindo essas duas rádios que conheci a banda Journey com o álbum Escape recém lançado e na programação das rádios tocavam muitas músicas desse disco como Open Arms, Stone Cold Love, Dead or Alive e às duas músicas lindíssimas que marcaram muito esse período Who´s Crying Now e Don`t Stop Believin`, essas músicas são muito especiais para mim pois me traz lembranças de um grande momento da minha vida. O Journey para mim, infelizmente não foi mais a mesma banda sem Steve Perry, sem dúvida um grande vocalista. Parabéns Sérgio Costa pelo excelente texto!
Muito massa você compartilhar essa história, Fernandão. E saber que o Journey foi parte importante de um momento seu. É isso aí, a música e suas vivências é um assunto fascinante. Abraço, meu amigo!