Os homens invisíveis estão nas ruas. Desde há muito os vejo nas esquinas. Cobertos de papelões, se aconchegam nos viadutos, em busca de escaparem do frio e da chuva. Durante o dia, perambulam atrás de trocados e comida nas portas dos restaurantes e nos semáforos, onde passam como sombras e nos fazem levantar o vidro e baixar os olhos para o celular, pois eles são invisíveis.
Um deles, usuário da fome e das coceiras pelo corpo, resolveu escrever com um pedaço de carvão em um papelão a sua dor invisível. “Ajude estou com fome. Moro na rua e não tenho trabalho. Mais tem Deus pra lhe dar”. Ele mesmo foi testar no sinal o seu banner. Muitos leram sem ver quem estava segurando. O homem por trás do cartaz e de uma máscara suja, com a marca dos dedos na parte que cobre o nariz, passava horas naquela exposição, diante dos motoristas apressados e míopes da realidade. Vez por outra, caía uma moeda. Centavos que estavam nos consoles enfeando a harmonia dos carros. Uma senhora, compadecida com uma mulher invisível, que carregava no colo uma criança invisível, juntou uma moeda de 50 centavos, três de dez e uma de cinco e deu à sua filha que estava no banco de trás.
– Dê essa esmola para essa pequenina que está nos braços dessa mulher.
A menina estendeu a mão, depositou as moedas na cumbuca de plástico suja e, rapidamente, quase teve seu braço preso pelo vidro elétrico acionado pela mãe.
A mãe se virou para a filha e disse:
– Está vendo, como é bom fazer caridade?
E a filha, inocente e sem miopia, respondeu:
– Vamos buscar aquelas bonecas que a senhora ia jogar fora pra ela? Vamos trazer comida pra ela?
Tá bom, recolha sua bolsa, já estamos chegando na aula de inglês.