(Trecho de artigo do economista Antonio Delfim Netto, publicado originalmente em www.cartacapital.com.br)
Se a crise de 2007-2009, que insiste em não terminar, tem a mesma origem que a de 1929, é preciso perguntar: como isso foi possível? A resposta é que, nos anos 90 do século passado, o sistema financeiro começou a libertar-se da regulação imposta nos anos 30, alegando que ela prejudicava o desenvolvimento econômico. Com apoio no Congresso e suporte “científico” inventado ad hoc por uma tribo de economistas, cujos membros se enganam e se divertem mutuamente com o conforto do “mercado perfeito” (até na moralidade!), teve sucesso. E muito lucrativo… Assistiu-se, assim, em 1999, à revogação final do Glass-Steagall Act, de 1933. Pois bem, em menos de dez anos, o novo sistema financeiro – outra vez completamente desregulado – voltou ao local do crime. Promoveu, ou pelo menos ajudou a promover, a maior crise econômica da economia real dos últimos 75 anos.
Como não sabemos como terminaria a crise de 1929 na ausência da preparação para a Segunda Guerra Mundial, continuamos a não saber como terminará a crise em que vivemos. Aparentemente, ela deixou uma desorganização que se manifesta na redução da capacidade política e do produto potencial de todas as sociedades, consequências da continuidade do absoluto domínio das finanças sobre a produção de bens e serviços, que até agora os governos foram incapazes de corrigir. É visível, por exemplo, a desorientação do Fed, que tem titubeado (e faz bem, porque as informações são contraditórias) diante do temor de uma recidiva, como aconteceu em 1937, quando antecipou sua manobra sobre a taxa de juros.
Foi essa incerteza que tirou da gaveta o fantasma da “estagnação secular” criado por Alvin Hansen, em 1939, e recuperado por Larry Summers, em 2013. O Brasil, pelo recente comportamento de seu Congresso, parece querer flertar com ela.