O Louco e o Estado – DIMAS MACEDO

O autor de O Louco e o Estado, Marcos Antônio Abreu, pontua que qualquer semelhança de suas personagens de ficção com a vida de algum leitor será mera coincidência. Tem consciência, portanto, de que sua criação literária é um objeto artístico e cultural, fruto de sua inteligência e de sua conexão com a realidade, mas que não se trata de uma reportagem sobre a vida de um grupo ou de uma comunidade determinada.

No Brasil, inúmeros nichos de miseráveis e desvalidos estão à margem da Sociedade e do Estado, desamparados e desassistidos, violentados em sua integridade e na fruição de seus direitos e de sua dignidade, vivendo como párias sociais que incomodam a perversão das nossas elites e dos seus aparelhos de repressão.

Marcos Antônio de Abreu é poeta, cronista, contista, romancista e cordelista, destacando-se, também, como músico e interprete de canções da MPB, dentre outros gêneros musicais. Foi fundador do projeto social O Sorriso da Poesia – poemas vendidos em toda a cidade de Fortaleza, com grupos fantasiados de super-heróis, e da ONG – Fraternidade, Arte e Cultura.

Integrante do projeto Rodas de Poesias, Marcos nasceu em Fortaleza (aos 15/02/1969), e o espaço dessa metrópole tem sido o palco de sua atuação como ator e escritor, declamador e agente social que busca a transformação da consciência das pessoas, especialmente, daqueles que vivem em condições abjetas.

Sua performance de poeta vai da Praça do Ferreira, onde o conheci ainda na década de 1980, até os rincões da nossa maltratada periferia, sendo de sua autoria, Poesias de um Poeta Louco (Fortaleza, 1995), Nas Teias da Poesia (Recife: Editora Passárgada, 1997) e Retalhos Poéticos, poemas livres e independentes, editados e distribuidos pelo autor.

É integrante das antologias Amor, Música e Poesia, organizada por Antônio Pompeu; Poetas da Praça do Ferreira, confeccionada por Márcio Catunda; e 100 Sonetos 100 Poetas, produzida por Luciano Dídimo, destacando-se pelos arranjos poéticos que aí são veiculados.

Cordelista de grande inspiração, é autor de A Cigarra e a Formiga (2009), A Revolução Humana (2011), A Estória de José Ribamar e o Surgimento do Boteco Jangadeiro (2012), A Coisificação da Sociedade na Pós-Modernidade (2017), Versos de Ouro (2017), O Rouxinol e Rosa (2017) e Colégio Ernesto Gurgel: Tradição e Eficiência na Arte de Educar (2017).

Seus cordéis foram publicados de forma independente, cinco saíram com o selo da ONG – Fraternidade, Arte e Cultura e outros foram editados pela Cordelaria Flor da Serra, mostrando-nos o autor a sua versatilidade como poeta e como produtor de folhetos de cordel.

Fundador da Escola Bíblica Sistemática, Marcos Antônio Abreu é um humanista dos mais qualificados. Culto, conversador e erudito, ele sempre pôs o seu coração a serviço do bem, ensinando, em suas residências, àqueles que precisam, o Evangelho de Jesus.

Marcos é um cristão com traços budistas bem acentuados, e dos espíritas ele herdou o gosto pela Fraternidade e a partilha do pão Espiritual, atividades a que se dedica com profissão de fé e amor ao desapego, sendo, por isso mesmo, um poeta e um criador da comunhão universal.

A sua atuação faz lembrar as figuras de Aírton Maranhão, Mário Gomes, Márcio Catunda, José Alcides Pinto e Guaracy Rodrigues, seres de luz e de talento que enriquecem a cultura cearense com a expressão de sua arte literária e o sopro de suas criações livres e povoadas de grande liberdade.

Identifico-me com muitos traços de sua personalidade e com os frutos da sua pregação política e ideológica, sendo ele, além de escritor, um dos nossos intelectuais mais consistentes.

O romance O Louco e o Estado (Fortaleza: Expressão Gráfica, 2019) constitui uma prova de sua intuição e do domínio da linguagem poética com a qual o autor anima o cenário social onde tecemos as relações com a vida.

Marcos tem o dom da palavra e é dotado de uma lucidez que nos espanta, e que nos aproxima da nossa unidade cosmológica. Sabe que as convenções sociais constituem uma grande mentira e que a Política e o Direito escondem uma violência e uma injustiça contra a Liberdade.

No caso de O Louco e o Estado estamos diante de um ficcionista maduro, carpido com o sangue das ruas e das praças, lugares onde o cotidiano das pessoas expõe o seu avesso e o espelho de suas necessidades. O sistema político e financeiro, social e religioso, e os aparelhos da Segurança e da Justiça são tratados pelo autor como instrumentos de coação e de patrulhamento.

Mais do que um romance de tese, o que vemos na ficção de Marcos Antônio Abreu é um corte de natureza filosófica aberto no coração da linguagem literária, cujos modelos pagam tributo às formas da gramática e não às formas do estilo e da realidade.

A busca de uma nova aurora para o homem e de sentidos para a vida em sua comunhão com o Uno estão no cerne de O Louco e o Estado, e com certeza irão deslumbrar os leitores e servir de orgulho para aqueles que admiram esse cordelista, poeta e romancista chamado Marcos Abreu, escritor e intelectual a quem devemos respeitar.

Dimas Macedo

Poeta, jurista e crítico literário. Professor da UFC.