O jogo do dinheiro – Osvaldo Euclides

O Banco Central tem uma função delicadíssima: diariamente compra e vende dólares em quantidades imensas, através de relações com as instituições financeiras que operam no mercado de câmbio. Embora não haja um valor definido como meta, todo mundo sabe que a taxa de câmbio do dólar é decisiva para equilibrar a balança comercial (exportações e importações) e o balanço de pagamentos (que inclui todas as transações brasileiras com o exterior, seja de mercadorias, seja de capital). A tese é que os empresários e agentes financeiros tenham estabilidade e previsibilidade para essa taxa, de maneira a poder planejar e bem executar seus negócios. E, claro, que se evitem solavancos de cotação, normalmente provocados por especuladores.

Pouca gente sabe que o volume de negócios da economia real são de cinco a dez vezes menores que os negócios feitos no mercado a termo (ou especulativo). Isso confere uma certa vulnerabilidade à estabilidade das cotações. Essa volatilidade que no Brasil é enorme, quando comparada a outros mercados similares, pode causar imensos prejuízos ao Tesouro, via Banco Central.

Essa volatilidade em forma de solavanco poderia ser evitada com benefícios a todos os agentes se o Banco Central atuasse preventivamente na regulação das operações a termo, estabelecendo limites e normatizando volumes, prazos, margens de garantia e critérios de informação de movimentos atípicos, sem quebrar a liberdade dos agentes, mas protegendo o país. Enquanto isso não acontece, o Brasil tem seu mercado de câmbio sujeito a solavancos e os cofres públicos ameaçados de prejuízos.

Mário Henrique Simonsen, um dos mais brilhantes economistas a ocupar o comando da economia do Brasil, costumava dizer que o câmbio era mais importante que a inflação – naquele tempo e até recentemente o país vivia de pires na mão – com uma frase lapidar: “A inflação maltrata. O câmbio mata”. Depois de governos recentes, a soberania foi conquistada, com as reservas de quase quatrocentos bilhões de dólares. Com reservas nesse nível, todas as crises econômicas ficaram muito menores, há liberdade para escolher caminhos sem o FMI, os governos estrangeiros e os banqueiros internacionais para impor condições.

Neste contexto, é estranho que a taxa de câmbio no Brasil continue sofrendo solavancos que só interessam a especuladores e que afetam lá na ponta o caixa do tesouro via atuação do Banco Central (o mandato do BC é apenas de combater a inflação, mas ele atua como espelho nas transações com moeda forte, comprando e vendendo).

Simonsen também dizia que a autoridade tinha de ter muito cuidado ao falar de câmbio e, se fosse o caso de proteger o interesse do país, tinha até o direito de mentir.

O ministro Paulo Guedes há algumas semanas disse: “estamos preparados para o dólar a R$4,20”. Ora, o mercado correu para outra escalada especulativa. É da natureza do mercado explorar as fragilidades de quem quer que seja. É o jogo do dinheiro. É a natureza do especulador.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.