O comportamento corruptivo dos agentes públicos

Não é difícil falar de corrupção. Os exemplos dessa prática existem aos montes no ambiente político eleitoral. E o tema me vem agora porque a campanha para as eleições de 2022 já se avizinha. É um tema fértil. Está distribuído entre artigos e normas diferentes; sua apuração pode ser feita em diversos momentos e resultante de diversas práticas.

A corrupção ativa no direito eleitoral está no art.299 do Código Eleitoral, tipificada como crime e pode acontecer ainda no período de campanha eleitoral, sendo capaz de prejudicar o processo eleitoral com o desequilíbrio na disputa.

Ora, as condutas de dar, oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva ou qualquer outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a oferta não seja aceita.

Observemos como é amplo este artigo. As condutas são variadas e a comprovação da prática é crime apenado com reclusão até quatro anos e pagamento de multa.

De outra banda existe o art. 41-A da Lei 9.504/97, que traz a captação ilícita de sufrágio com os núcleos de conduta: doar, oferecer, prometer ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública, desde o registro da candidatura até o dia da eleição, inclusive, sob pena de multa, cassação do registro ou do diploma.

Exige, a lei, para a caracterização da conduta ilícita, a evidência do dolo e a ação cabível para apurar a conduta e aplicar as sanções pode ser a ação de investigação judicial eleitoral.

Há ainda as condutas vedadas aos agentes públicos em campanha eleitoral. Estão no art.73 da Lei 9.504/97 e podem ser resumidos em diversas condutas como o uso e a cessão, em benefício de candidato, partido ou coligação, de bens pertencentes à administração pública, o uso da máquina patrol para abrir estradas ou fazer açudes; o uso de serviços custeados pelo governo ou casas legislativas, como aqueles favores obtidos dos assessores de políticos; a cessão de servidores públicos ou empregados para fazer campanha eleitoral, quando na hora do expediente ou fora dele os servidores são obrigados a trabalhar para a autoridade em campanha e ainda as nomeações e demissões diversas de servidores nos 3 meses que antecedem o pleito. E as improbidades administrativas que – quando julgadas, podem fundamentar inelegibilidades!!!! As previsões de condutas existem, as sanções são aplicadas e, ainda assim, não se coíbe a prática de corrupção.

Os processos lotam os fóruns eleitorais – utilizados por vezes, como forma de campanha política, mas em muitos casos, tem conjunto probatório e autoria certa.
Inventa-se uma lei da ficha limpa e os partidos utilizam-na para selecionar os recrutados, mas não se fala na prática da boa política de modo tão insistente como se fala na corrupção.

O que aconteceu? Sempre foi assim? Houve um momento em que tínhamos melhores candidatas e candidatos? Onde erramos? O que é a boa política? Por que a boa gestão é algo tão raro?

Observa-se que em relação às eleições de 2020, por exemplo, no Ceará, ocorreram eleições suplementares em seis municípios e em quatro deles a cassação dos mandatos se deu por prática de abuso do poder econômico, contratação irregular de servidores em período anterior à eleição, abuso do poder político, prática de atos de improbidade em gestão anterior.

Estes fatos, no entanto, se repetem há anos, o mesmo modus operandi, o mesmo objetivo, com chances iguais de êxito.
Alguns gestores municipais permanecem na prefeitura por anos, mantendo um eleitorado fiel e impossibilitado de pensar por si mesmo porque não tem condição de refletir sobre a sua própria realidade.

E não me venha dizer que a reeleição é a última chance porque não é: há casos no Ceará onde o prefeito se perpetua no cargo elegendo como figurante parentes ou apadrinhado político.

As condutas praticadas por esses gestores podem ser facilmente caracterizadas como corruptivas porque a máquina administrativa está com ele, os recursos são geridos por ele e o eleitorado não fiscaliza porque não sabe por onde começar, o que fazer, aonde ir. Às vezes tem a informação, mas não sabe o que fazer com ela, sem contar que, o descrédito num governo capenga motiva a troca do voto por necessidades básicas: a iluminação da rua, a cirurgia de ligação, o tratamento dentário, a cesta básica, a carona para o hospital. Não é pouco, dependendo do momento, o favor não tem preço e o exercício do sufrágio é o de menos.

Penso que a cultura da boa política deve ser disseminada no interior do ambiente político, entre as disputas, mas temo que essa conversa seja vazia e sem lugar para ficar. Penso que os partidos poderiam levantar essa bandeira que pode ser honesta, com boas intenções, com possibilidade de escolhas, e sobretudo com informação segura.

Por que é tão difícil construir um discurso sobre boa política? Não há escuta, não há público, não há espaço. Há desilusão com a política e com os políticos, e novas eleições se aproximam. Os procedimentos eleitorais se iniciam, os partidos se preparam e fazem as alianças, há quem fale em federações na ilusão de um casamento seguro entre agremiações que não conseguiam, em passado recente, formar coligações críveis.

Não peço mentiras, pois creio, como Max Weber, que o homem que se entrega à política aspira ao poder, mas acredito que esse poder pode se compatibilizar com participação de indivíduos, redução de desigualdades sociais, bom uso da máquina pública.

Adriana Soares Alcantara

Mestre e Doutoranda em Planejamento e Políticas Públicas da UECE Pesquisadora integrante do Grupo de Pesquisa da UECE na linha "Política faccionada e atuação dos partidos políticos em âmbito subnacional". Servidora do TRE e Integrante da Comissão de Participação Feminina CPFem