Notas taquigráficas caracterizam-se pela escrita rápida. Requer a experiência de profissionais treinados capazes de utilizar simbologias ou taquigramas para reproduzir a comunicação dos oradores dos quais transcrevem suas expressões. Existem numerosos sistemas de símbolos taquigráficos, porque o importante para o sistema é ser capaz de traduzir a mensagem.
No dia 18 de janeiro, o general de divisão Richard Nunes emitiu uma nota oficial em nome do comando do exército, contra o texto do jornalista Luiz Fernando Vianna, da Revista Época. Segundo o general, Vianna “revela ignorância histórica” não compatível com o exercício da atividade jornalística. Por conta disto, o exército “exige imediata e explícita retratação dessa publicação, de modo que a Revista afaste qualquer desconfiança de cumplicidade com a conduta repugnante do autor e de haver-se transformado em mero panfleto tendencioso e inconsequente”.
O jornalista Luiz Fernando inicia seu referido artigo com o seguinte parágrafo: “Em vários momentos de nossa história, o Exército brasileiro se pôs a matar a população em grande quantidade. Na Revolta de Canudos, por exemplo, destruiu um povoado de 25 mil habitantes, na Bahia, em 1897. Nem as crianças foram poupadas”. Em seu livro “Os Sertões”, o escritor e cientista social Euclides da Cunha, que passou três semanas documentando aquele massacre, como correspondente do jornal O Estado de São Paulo, deixou documentado: “Aquela campanha militar do exército brasileiro lembra um refluxo para o passado. E foi na significação integral da palavra um crime. Denunciemo-lo”. Os Sertões é um dos marcos literários do pensamento sobre o Brasil.
No segundo parágrafo de seu bem escrito artigo, Vianna registrou: “A Comissão Nacional da Verdade, que atuou entre 2012 e 2014, apontou 434 mortos e desaparecidos no Brasil pelo Estado brasileiro entre 1946 e 1988. A maior parte dos crimes aconteceu durante o regime militar (1964-1985), quando as Forças Armadas se uniram às polícias para torturar e assassinar”. Em entrevista a um canal de televisão, o então ex-capitão Jair Bolsonaro, afirmou textualmente: “Sou favorável à tortura”. (https://www.youtube.com/watch?v=hGu2tzkfEo8). Em 17 de abril de 2016, em seu voto como deputado federal, na sessão do impeachment de Dilma Rousseff, gritou: “Pela memória do coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra (declarado oficialmente pelo Estado brasileiro como criminoso torturador), o pavor de Dilma Rousseff! O meu voto é sim”. (https://www.youtube.com/watch?v=xiAZn7bUC8A.)
Portanto, o que o jornalista escreveu, do ponto de vista histórico, encontra alicerce em ampla documentação, avalizando o seu texto. A partir desta introdução, Vianna fez uma análise do tempo pandêmico a que estamos submetidos, buscando colocar em luz os desacertos do comando do governo federal, mais precisamente do presidente da República e de seu ministro da saúde, general da ativa Pazuello, no enfrentamento nacional da pandemia. De fato, não só o jornalista, mas uma infinidade de cientistas, políticos, trabalhadores, representantes de entidades diversas, juristas, principalmente a partir da tragédia de Manaus escancarada agora no mês de janeiro de 2021, estão fazendo a denúncia responsável da incompetência e irresponsabilidade da política federal de enfrentamento do Covid-19.
Importante destacar que o real valor da Liberdade de Expressão e de Imprensa é o PÚBLICO. A liberdade de imprensa está principalmente no direito de ler, de ver, de escutar e de debater dos cidadãos. É o direito do público de ter acesso a ideias variadas e a visões diversificadas sobre os fatos, inclusive daquelas diferentes que ele já conhece e aprova. O público tem autonomia. É no direito que o público tem de ser exposto ao novo e ao desconhecido que reside a importância democrática e cultural da liberdade de imprensa e de expressão. Como lembra o prêmio Nobel de literatura, Bob Dylan, é fundamental conhecer a história – os fatos – porque algo está acontecendo e você não sabe o que é.
Levantamento realizado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) mostra que apenas nos primeiros quatro meses de 2020 – sem contabilizar os registros das agressões do ano de 2019 – Bolsonaro investiu 179 (cento e setenta e nove) vezes contra a Imprensa com as mais variadas agressões verbais, sinalizando com esta postura uma autorização para o seu rebanho, dos mais variados espécimes, reproduzir as mesmas agressões em seus ambientes cotidianos e em suas manifestações de rua.
Como não bastasse a nota excêntrica do exército, ontem, 19, o procurador-geral da República, Augusto Aras, também se deu ao luxo de emitir também a sua nota. Na sua comunicação o procurador disserta sobre o estado de defesa. Diz: “O estado de calamidade pública é antessala do estado de defesa. A Constituição Federal, para preservar o Estado Democrático de Direito e a ordem jurídica que o sustenta, obsta alterações em seu texto em momentos de grave instabilidade social. A considerar a expectativa de agravamento da crise sanitária nos próximos dias, mesmo com a contemporânea vacinação, é tempo de temperança e prudência, em prol da instabilidade institucional”.
O estado de defesa é previsto no artigo 136 da Constituição Federal. As restrições previstas no decreto, entre outras, são: ao direito de reunião, ainda que exercida no seio das associações; sigilo de correspondência; sigilo de comunicação telegráfica e telefônica.
Portanto, em dois dias, duas notas intrigantes: uma do comando do exército, outra do procurador-geral, ameaçando a democracia. Quem está com o seu gado, desde 2019, em manifestações públicas, colocando em cheque os valores e as instituições democráticas, continua a cometer suas leviandades. Enquanto isso, a “gripezinha”, assim denominada por Bolsonaro, segundo números oficiais, já ceifou a vida de cerca de 220 mil pessoas, penalizando também pela dor da perda seus parentes e amigos. A verdade é dura de ser encarada, dói, incomoda, deixa as pessoas irritadas. Por isso emitem notas e mais notas.