Se você espera que através deste artigo seja possível analisar seus sonhos, desista! Este artigo tem a intenção de falar sobre a formulação dos sonhos e ao quê eles podem nos remeter. Para o processo de interpretação dos sonhos e dos sintomas, somente através da experiência analítica e do discurso do analisando será possível esta identificação.
A maioria dos sonhos parecem se apresentar de forma incoerente. Se associarmos a combinação de imagens e signos na formação do sonho, a cena poderá ser enfatizada como algo no âmbito do surreal. Assim, podemos ficar confusos a respeito do significado do conteúdo dos sonhos, acreditando que eles não substanciam qualquer ideia relevante. O que é crucial na análise é o relato dos sonhos com suas construções e entendimento das intenções do inconsciente.
Lacan nos afirma que “é, portanto, do conteúdo latente e não do manifesto que se extrai o significado do sonho.”. Ou seja, aquele conteúdo que é apresentado durante o sonho precisa ser analisado para chegarmos aos conteúdos que estão por trás dele, podendo assim entender o que aquela cena, dita como “surreal”, de fato significa.
A força motivadora dos sonhos são nossos desejos e é ao dormir que nossas censuras internas, nossas resistências a esses desejos, são reduzidos, e neste momento nosso inconsciente pode apresentar o que muitas vezes procuramos negar. Através dos sonhos nos deparamos com nossos medos, anseios, preocupações, impulsos emocionais, fantasias, desejos, que muitas vezes barramos no nosso dia a dia. Porém, ainda volto a afirmar que, de acordo com Lacan, o conteúdo manifestado no sonho não faz referência direta a todas estas questões, o funcionamento psíquico está para além disso tudo, somente em um processo terapêutico podemos interpretar o conteúdo do sonho. Diferente dos sonhos que revelam signos e imagens, a metáfora revela o sintoma em si.
Forrester, um autor que nos trouxe os conteúdos estudados por Lacan, nos fala que “não é possível dizer que um sonho é somente um sonho, na medida em que ele é um ato mental e parte integrante da vida interior de cada um.”.
Mas, e aqueles sonhos que não lembramos? Neste caso, podemos dizer que alguns conteúdos ainda são difíceis de serem revelados e que nem no sonho as censuras conseguiram ser desarmadas.
Os sonhos são paradigmas, o que se sobressai nos sonhos são nossos desejos. Se o sonho é a realização de um desejo, como fala Lacan, é necessário diferenciar entre os sonhos claros quanto à sua realização e os sonhos que “mascaram” a realização, como os pesadelos e os sonhos de angústia. Freud enumera algumas origens do desejo: o desejo despertado durante o dia e que não pode ser satisfeito, tornando-se um desejo reprimido, como a vontade de fazer sexo ou algum momento de raiva não extravasado, e o desejo do inconsciente propriamente dito, que só aparece no estado de sono.
Não podemos esperar que nossos sonhos possuam uma cronologia convencional, nem tampouco um clímax da narrativa ou até um fim. É o desejo oculto formulado pelo inconsciente que formula a lógica do sonho.