LIMPE, a Justiça e a Imprensa – por Osvaldo Euclides

Limpe. Essas cinco letras são as iniciais dos cinco princípios constitucionais que devem orientar e condicionar todo e qualquer ato na administração pública. Legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Fora a moralidade que é difícil de medir ou mesmo apenas apalpar, os quatro outros podem ser facilmente observados e monitorados pela sociedade, se a esta sociedade forem dadas as informações necessárias e devidas. Os princípios são mais ou menos óbvios, conforme as pessoas tenham maior ou menor proximidade com a vida pública. Em poucas palavras, legalidade – o gestor e o servidor só podem fazer o que a lei prevê, nada além, nada aquém; impessoalidade impõe que todos (assuntos ou pessoas) sejam tratados de forma igual, ou adequadas às diferenças previstas; publicidade – a regra é a transparência, a ampla publicidade, afinal tudo é público (o serviço, o servidor, o gestor, os recursos), o segredo é a exceção (e a exceção tem que estar prevista na lei); e a eficiência – há que haver zelo e parcimônia no uso do dinheiro público, a opção tem que ser pela melhor relação custo/benefício (para o erário).

Uma certa arrogância dos ocupantes das mais altas funções, entretanto, dificulta que a sociedade receba as tais informações necessárias e devidas para que ela possa monitorar seus representantes e a própria qualidade do serviço público. Os poderosos de plantão preferem as sombras e fogem de cumprir as regras básicas de transparência e de prestação de contas. A publicidade deveria ser isso: informação tempestiva e prestação de contas em tempo real. Infelizmente, a publicidade se afasta do princípio constitucional e se transforma em propaganda de governos e governantes da hora e não raro torna confusas as relações entre a imprensa e o poder do Estado.

E aí tudo se mistura: publicidade, propaganda, Estado, governo, governantes, informação, opinião, liberdade de imprensa, liberdade de expressão, transparência, prestação de contas. Quantos entre os brasileiros são capazes de entender cada um destes conceitos, separá-los e cobrá-los? Na verdade, poucos, muito poucos. E alguma confusão entre eles termina por ser conveniente para muitos.

Eventos recentes envolvem a Imprensa (instrumento natural de publicidade) e a Justiça. e a confusão dos conceitos parece metodicamente plantada e cultivada. A palavra “suposta” vem sendo usada e abusada por estes dias.

O que um servidor ou gestor público faz no seu serviço não é segredo, não deve ser segredo, não pode ser segredo, exceto se for declarado assim, nos termos da lei. Os casos mais em voga envolvem servidores e gestores públicos, usando equipamentos públicos, no ambiente de trabalho público e tratando de questões e assuntos públicos. Não há limites ao princípio da publicidade, para a transparência, exceto a lei que estabelece o que é segredo. Se agentes públicos têm comportamento que não pode vazar, é possível e provável que esse comportamento seja criminoso, ou imoral (sic), ou aético. No ambiente da Justiça, a lei prevê consequências para tais comportamentos (digamos) impróprios.

A Imprensa entra na questão porque ela é o braço da sociedade na vida pública. Jornais, revistas, rádios, televisões e blogs são os olhos da sociedade. E não podem ser impedidos de relatar o que veem, o que sabem ou o que venham a saber, e os profissionais do setor sabem nitidamente como agir de forma responsável. Para isso todo veículo de comunicação tem uma hierarquia de decisões que vai do repórter ao dono da empresa, passando por chefes, editores e diretores. A imprensa não costuma agir por impulso. E ela tem seus princípios e valores a respeitar, e a sociedade sabe quem acaba por merecer respeito.

O direito à privacidade não se aplica nem ao servidor nem ao gestor público, no que se refere a suas atividades no trabalho e de trabalho.

O direito à privacidade é inerente ao particular, ao cidadão comum, esse direito é amplo, cobre praticamente todos os seus atos, até o limite em que ele viola a lei. Sim, porque o particular pode fazer tudo que a lei não proíbe. (Lembre: o servidor público tem que fazer só e somente só o que a lei manda).

Uma coisa mais cabe dizer.

É a Justiça que tem de trabalhar com provas.

À imprensa basta trabalhar com fatos, ou informações ou mesmo com a controvérsia, de forma honesta oferecendo as versões.

O bom jornalista e o bom jornalismo sabem de tudo isso.

É o óbvio ululante.

 

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.