JÂNIO, COLLOR, BOLSONARO, MARÇAL

“A única árvore frutífera que pode se autolimitar é você, porque ainda não entendeu o natural da vida, que é prosperar (para ele é ficar rico com capital, algo impossível de ocorrer coletivamente). Mas para isso acontecer, você precisa produzir (ele se refere à mercadoria, cuja produção escraviza quem a produz com seu próprio suor).
 
Pablo Marçal (com adendos entre parênteses de minha própria autoria).
 
A causa do populismo de direita historicamente ganhar espaço entre a população a ponto de receber dela repetidos apoios eleitorais, deriva da inconsciência coletiva sobre as razões do seu próprio infortúnio social.

Para um Pablo Marçal, que aos 37 anos de idade tem patrimônio declarado (fora o sonegado) de mais de RS 160 milhões, amealhado vendendo a ilusão de possibilidade de riqueza fácil a uma população desesperada, atuando como “coach”, a política burguesa é um forte atrativo de manipulação da consciência coletiva para a obtenção do poder político.
A manipulação da opinião pública numa sociedade na qual o povo é explorado pelo capital e induzido a desejá-lo tal qual um viciado em jogatina, e como forma de obtenção de independência econômica e social, é facilmente factível a partir de um discurso que distorce e inverte conceitos parecendo que o manipulador é um messias salvador.

É muito comum que entre os pobretões existam alguns que conseguem furar o bloqueio imposto pelo capital e se tornem ricos capitalistas. Nas periferias e favelas do Brasil sempre se encontra um ou outro que conseguiu montar um pequeno negócio que cresceu e se tornou, ilusoriamente, exemplo a ser seguido, como se tal resultado fosse facilmente alcançado por todos.

Os grandes capitalistas (alguns originários de famílias pobres) se tornam, nesse contexto, heróis benfeitores sociais, ao invés de serem considerados criminosos por apropriação indébita do tempo-valor alheio; é assim que os messias populistas da vida política social burguesa manipulam as consciências.
Ainda outro dia ouvimos e vimos o homem da Havan, ser aplaudido por parlamentares da sua laia no Congresso Nacional (a maioria que sempre tem assento por lá), vestido de verde amarelo tal qual um falso papagaio, jactando-se de dar 100 mil empregos em suas lojas, como se salvasse a vida dessas famílias, e não que fossem seus empregados os que lhe propiciam a condição de poderoso bilionário.
Marx usou a expressão latina antiga “aura sacra fames” (sagrada sede do ouro) para demonstrar quão antigo é o fetichista sonho de obtenção de riqueza individual.
Dinheiro sempre foi poder, e quando se junta a possibilidade de obtenção de poder político como canal subserviente de manutenção do capital e de controle para o próprio enriquecimento privado capitalista, resta demonstrado como errático e vulnerável é o modelo de sociedade sob o qual vivemos atualmente.

O fenômeno é mundial, e vai desde um Trump, um bilionário que usa o poder político como forma de se imunizar dos seus crimes, e um Elon Musk, bilionário da indústria automobilística (inclusive na China com seus carros elétricos BYD – Build Your Dreams – construa se sonho), espacial e da comunicação eletrônica, com intenções políticas monopolistas, a um Putin, um ex-dedo-duro da KGB que ascendeu ao poder vendendo o sonho da força militar como instrumento capaz de promover a restauração do saudoso imperialismo da União Soviética, e se tornou bilionário juntamente com os oligarcas russos que compraram as estatais a preços de bananas.
Adolf Hitler e Hermann Göring também tinham a mesma pretensão e naufragaram no sonho nazista megalomaníaco que teve (e ainda tem) a mesma natureza, mas não sem antes levar a humanidade a um genocídio de 50 milhões de pessoas ou 3% da população mundial de então.

O poder político é excludente e vertical porque o capital tem sentido de acumulação excludente vertical. O escravismo direto antigo tinha uma forma política que lhe era imanente; o capitalismo e sua escravização pelo trabalho abstrato tem a sua forma política que se consubstancia no engodo democrático burguês, que, não raro, deriva para autocracias como forma do dirigente se manter do poder político quando lhe falta apoio popular, ou mesmo tendo esse apoio.
Jamais fazem autocríticas em ralação às suas intervenções belicosas; justificam suas ações como defesa do seu povo, ainda que o povo alheio seja por ele assassinado.

Os Estados Unidos jamais fizeram autocrítica da intromissão genocida no Vietnã, no Iraque, no Afeganistão, no Kuwait, na Argentina, no Brasil, no Chile, e em tantos outros países mundo afora; a Rússia de Putin, invadiu a Lituânia; a Tchetchênia; a Georgia; a Criméia, e agora está a cometer uma guerra genocida com a morte de milhares de civis na Ucrânia, que sob todos os aspectos já representa para ele uma derrota moral.

Quer saber como a coisa aconteceu na Ucrânia? Depois de envenenar Viktor Yanukovych com dioxina (é um dos métodos da KGB para matar adversários) nas eleições Ucranianas por considerar que ele era avesso aos interesses russos, o candidato se tratou na Suíça, escapou de morrer e foi eleito; tomou posse a posteriormente foi mal avaliado perdendo prestígio interno.

Com o país em dificuldades (como sói acontecer no capitalismo), veio um conturbado processo de deposição e ele botou a polícia e o exército nas ruas que mesmo com muitas mortes de civis saiu derrotado pelo povo em armas. No governo fez aliança com Putin, e deposto, exilou-se na Rússia com seus bilhões de dólares.

O atual Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, anti-russo, está a se defender de uma agressão imperialista e resistindo com o apoio da Otan, num conflito que todo dia se veem e ouvem ameaças nucleares.
Em meio a essa disputa por hegemoniza capitalista do ocidente e oriente, o que está a dirigi-los, mas raramente criticado em sua essência constitutiva, é a relação social sob a forma-valor, ora em fase de limite interno de expansão por suas próprias contradições, que representa o fracasso de todos os governos, além de ser o artífice da segregação social pela acumulação autotélicas da riqueza abstrata (dinheiro e mercadorias) imposta aos trabalhadores que produzem a dita cuja.

A eleição burguesa é o espaço de manipulação das consciências e campo propício para os populistas de direita atuarem com seus discursos mentirosos e ilusionistas que produzem o brilho efêmero de uma joia falsa que ilude a todos os desavisados;
– onde o explorador capitalista passa a ser o empreendedor provedor que propicia o emprego ao trabalhador explorado;
– onde o desenvolvimento econômico a partir da mercadoria dinheiro passa a ser objetivo de todos os atores da cena política;
– onde a polícia a serviço da lei burguesa opressora passa a ser a defensora indispensável do seu cumprimento e da “ordem para o progresso”;
–  onde a cobrança de impostos a uma população exaurida pela extração de mais-valia passa a ser contributo indispensável à execução das demandas sociais que pelas suas mãos, dizem eles, serão pretensamente impecáveis e a sonegação fiscal um crime hediondo;
– onde a discriminação social pela polícia passa a ser o instrumento único capaz de conter a violência urbana causada pelo capitalismo que eles tento defendem;
– onde a xenofobia nacionalista passa a ser contributo patriótico em defesa da cidadania nacional protetora;
– onde o racismo e a misoginia são encobertas pelo manto de veludo da imagem de beleza étnica e da unidade familiar;
– onde a religião funciona como promessa de recompensa celestial às agruras terrenas e o dízimo pago em dinheiro voltará multiplicado para o bolso do incauto dizimista;
– onde milicianos exploradores da venda de proteção elegem seus representantes na estrutura do poder político com o voto comprado em troca dessa mesma “proteção”;
– onde a corrupção com o dinheiro dito público seja tolerada desde que praticada por eles e pelos seus acólitos;
–  onde críticas às práticas antiecológicas sejam coisas de ecochatos que não compreendem a importância do desenvolvimento econômico, como se este último fosse o único modo de melhoria social e relação social possíveis.
Enfim, o vilão se traveste de cordeiro sem que seja tosquiado para que se chegue à essência negativa de seu perigoso disfarce.
Ufa!!!
Recentemente publiquei um esboço de proposta constitucional de uma sociedade na qual estivessem presentes e em conjunto, um modo de produção social fora do capitalismo e capaz de propiciar uma organização social de base a partir de cânones jurídicos que lhe fossem imanentes (se quiser pode consultar no anexo abaixo).

Entendo que somente o povo, organizado em células comunitárias deliberativas de interesses comunitários e gerais, sem representante políticos distanciados desses interesses, e sob um modo de produção que não aceite a intromissão indevida do dinheiro em cada objeto de consumo que ele transforma em mercadoria, será possível termos o exercício legítimo da soberania da vontade popular capaz de corrigir seus próprios erros e a aprimorar seus acertos e virtudes morais e éticas.

Esse é um argumento que introjeto na minha mente apenas como o início de um processo que antes de defender a importância de negar o voto numa eleição cujos vícios todos conhecemos, necessita concomitantemente de mãos paradas contra o modo de produção capitalista e de se fazer ruir o aparentemente indestrutível edifício de uma relação social militarmente e belicosamente defendida como se fosse guardiã do bem, da moral e da ética sagradas e que está nos levando ao abismo e à possibilidade do fim trágico de toda a humanidade

Dalton Rosado

Dalton Rosado é advogado e escritor. Participou da criação do Partido dos Trabalhadores em Fortaleza (1981), foi co-fundador do Centro de Defesa e Promoção dos Direitos Humanos – CDPDH – da Arquidiocese de Fortaleza, que tinha como Arcebispo o Cardeal Aloísio Lorscheider, em 1980;