O processo se inicia cedo, de forma inocente, quando aquela tia que nos visita de tempos em tempos pergunta: “O que você vai ser quando crescer?” A instrumentalização do saber dura a vida inteira e, sem perceber, vamos embarcando na cresça de que conhecimento bom é aquele que gera dividendos econômicos, melhorias salariais, cargos, promoções para, na sequência, alcançar o poder do consumo. Mas, será que o estudo se resume apenas a isto?
Hoje, tempos velozes de alta tecnologia, de abundância dos dados, informações e conhecimentos e de facilidades em áreas como a comunicação – mesmo que não se saiba o que fazer com tudo isso! – falar em coisas “difíceis e demoradas” e que “dão trabalho para se conseguir” é de gente desconectada que perambula errante pelo o mundo. A ideia sempre bem-vinda é “para que complicar”, levando-se em consideração que “complicar” é usar o estudo ou o desenvolvimento intelectual para outras realidades que não aqueles onde quem manda é o dinheiro ou onde impera a infame – mas real! – frase “o que vou ganhar com isso?”
A busca por caminhos para se conseguir e posteriormente aumentar o poder de consumo passa pela construção da mentalidade (mindset a longo prazo) que vem desde a família até a vida adulta, passando por todo o ciclo de estudo formal, do fundamental às pós-graduações. O estudo com foco no “ter” (diplomas, notas, carreira, curtidas [likes] etc.) não sustenta por muito tempo quem opta por estes atalhos. É como se vivêssemos uma verdadeira intelectofobia, levando o neologismo para o campo, por exemplo, da contemplação e da busca pelo entendimento de tudo aquilo que nos rodeia, e de tudo aquilo que nos faz seres humanos.
Diante da velocidade que toma nosso quotidiano, parar para poder pensar é algo que não encontra parâmetro. O silêncio já nos incomoda, como o barulho fazia aos nossos antepassados. Vejamos as atuais composições (!?) musicais, onde sobram sons (perdoe o eufemismo) e quase desaparecem as palavras e frases com sentido. Quanto mais ritmado e pulsante, menos há carência das ações “difíceis”.
O conhecimento deve ser proposto para gerar as possibilidades também do “ter”, o que é óbvio demais para gastarmos linhas na defesa deste fato, porém, em primeiro lugar, aprender, estudar ou como queiramos chamar a geração de uma realidade intelectual é, antes de tudo, o caminho para o aperfeiçoamento de si e, por consequência, de toda sociedade. É em primeiríssima instância prestar atenção em nossa alma, onde residem a vontade e a inteligência. É onde também encontramos a Deus. Um escândalo para estes tempos, não é mesmo? Provavelmente sim, para muitos, mas para outros trata-se de uma realidade que se vê, se reservarmos tempo para isso. Subjetivo? Que nada! Se conseguirmos tal façanha (tempo), profissionais podem melhorar seu desempenho como agentes modificadores de si e da sociedade que acaba por seguir o mesmo rumo. Comunicando isso por estratégias de endomarketing, empresas e seus colaboradores entrariam em sintonia, onde o valor gerado – a qualificação do ser – entraria como lucro para todos. É aí que a referência às conquistas financeiras passa a estar alinhada ao “ser” na colheita dos dividendos do “ter”. A inversão desta regra deve ser combatida.