Haddad e a má vontade dos idiotas da obviedade, por Sérgio Saraiva

O prefeito Fernando Haddad começou seu mandato em 2013 com a promessa de uma revolução urbanística e social em quatro anos. Seus resultados ao deixar a prefeitura mostram que cumpriu o que prometia.

Mobilidade urbana, ciclo-faixas, faixas exclusivas para ônibus e a Paulista aberta ao público como área de lazer, além de talvez sua maior obra: a redução das mortes no trânsito.

Os ônibus do transporte público continuam lotados. Mas a população passa menos tempo dentro deles, com as faixas exclusivas de ônibus, no pico da tarde, velocidade aumentou de 15 km/h para 17 km/h. Longe da média ideal de 25 km/h, contudo, as faixas são aprovadas por 92% da população.

Quem viaja pelo Brasil vê as faixas exclusivas de ônibus sendo adotadas em várias cidades do país. É a administração Haddad fazendo escola.

Um ano e três meses depois da implantação do programa de redução dos limites de velocidade ter entrado em vigor nas marginais Tietê e Pinheiros, o número de acidentes fatais  nas duas vias caiu pela metade – 39 morte nos últimos 15 meses contra as 77 mortes no período anterior de maio de 2014 a julho de 2015.  A marginal Tietê não registra mortes por atropelamentos há mais de um ano e meio.

O Programa Braços Abertos – a sensibilidade social mostrando um caminho para enfrentar a questão complexa da “cracolândia”. Com o acolhimento dos dependentes químicos, os viciados relatam diminuição do uso da droga. Mas a situação da região continua problemática. De qualquer modo, tornaram-se obsoletas as ações do governo anterior que, em parceria com o governo estadual de Alckmin do PSDB, promovia ações de guerra da polícia com cães, cassetetes e balas de borracha.

E o enfrentamento à corrupção com a criação da Corregedoria Geral do Município que desbaratou a máfia do ISS, nos primeiros dias do governo Haddad. Desde então, a atuação da CGM nesse e em outros casos ajudou a devolver mais de R$ 600 milhões aos cofres municipais. A controladoria também trouxe ganhos em economia ao fiscalizar contratos e melhorou a transparência dos dados da gestão.

Em alguns casos, mesmo não atingindo a meta, conseguiu avanços. Um exemplo são as 100 mil vagas em creches – a promessa eram 150 mil. A fila ainda é de 133 mil crianças de 0 a 3 anos. Ou seja, se o próximo prefeito tiver o mesmo empenho e sucesso de Haddad, a questão das vagas para creches poderá ser zerada em mais um mandato. Dória promete zera-la em um ano – a conferir em 2020.

O reconhecimento do sucesso da administração Haddad pode ser medido pelos prêmios que recebeu. Em 2014, o Programa Braços Abertos ganhou o Prêmio David Capistrano no 28º Congresso de Secretários Municipal de Saúde do Estado de São Paulo. Em 2015, as ciclo faixas e faixas exclusivas de ônibus ganharam nos EEUU o prêmio da 10º edição do “Sustainable Transportation Award”. E em 2016, a administração Haddad ganhou o Prêmio “Mayors Challenge” promovido pela Bloomberg Philanthropies.

Mas talvez o maior reconhecimento à competência da gestão Haddad tenha sido a obtenção da classificação de grau de investimento da agência Fitch Ratings.

Isso porque Haddad é o “prefeito da crise”.

Recém-empossado, os protestos de junho de 2013 o levaram a voltar atrás no aumento do preço da tarifa de ônibus que havia acabado de reajustar. Essa medida fez a prefeitura desembolsar mais dinheiro do caixa da cidade para pagar as empresas de ônibus. Coisa da ordem de R$ 1,4 bilhão, naquele ano.

A segunda perda de receita de Haddad ocorreu quando a Justiça barrou por um ano o reajuste do IPTU. Uma ação intervencionista do Judiciário com fundo político e patrocinada pelo indefectível “Skaf da FIESP” que barrou lei aprovada pelo Legislativo e sancionada pelo Executivo paulistanos. Com tal lei, Haddad implantava o IPTU progressivo que aumentava o número de contribuintes isentos e aliviava a taxa do imposto nos bairros mais pobres, mas aumentava substancialmente o imposto dos mais ricos.

Porém, o grosso do dinheiro que bancaria as obras viria do Governo do Federal, mas, com a crise do governo Dilma Rousseff, na prática, dos R$ 9 bilhões prometidos, nem R$ 2 bilhões chegaram à cidade, em um pacote de obras de transporte, habitação, saneamento e contenção de enchentes, entre outras.

E sem dúvida, a recessão que o país atravessa desde 2015 em nada contribuiu para o aumento da arrecadação do município, ao contrário.

Não é por outro motivo que Haddad em entrevista à Folha tenha apontado a administração financeira do município como seu principal legado:

“Acho que o recorde de investimentos em meio à maior recessão da história recente é prova de gestão exemplar, ninguém conseguiu fazer isso. O fato de termos terminado a gestão com os melhores indicadores dos últimos 20 anos, nos transformando numa espécie de oásis no meio da calamidade financeira que assola o país, é uma demonstração de que atravessamos o pior momento da vida republicana recente com muita dignidade”.

Poderia ter dito mais. Poderia ter lembrado a “herança bendita” que deixa para o seu sucessor. A renegociação da dívida com a União reduziu o saldo devedor da cidade de R$ 76 bilhões para menos de R$ 30 bilhões. Com isso, diminuem as parcelas pagas anualmente e aumenta a capacidade de investimento. A gestão Doria deve se beneficiar da renegociação, já que a cidade poderá voltar a buscar financiamentos para obras de grande porte.

A administração Haddad é um desses paradoxos da política que necessitam de tempo para serem entendidos. Foi uma das melhores gestões desde muito tempo, acabou rejeitada pela população que não concedeu à Haddad um segundo mandato.

Um comentário necessário.

Não será, por certo, lendo a Folha que entenderemos o que se passou na cabeça do paulistano dentro da cabine eleitoral.

Todo o conteúdo deste texto foi tirado da própria Folha com acréscimos de uma breve pesquisa à internet. Em muito, foi tirado da própria reportagem  ”Haddad encerra mandato com só metade das promessas cumpridas”.

Somente a má vontade explica como a Folha pode traçar a seguinte imagem da gestão Haddad:

“o cenário deixado é de corredores de ônibus, escolas e unidades básicas de saúde apenas no papel, além de esqueletos de prédios populares ainda não entregues”. 

Quanto à baixa porcentagem de metas cumpridas, pegaram o Plano de Metas de 2012, desprezaram o contexto sócio-político e econômico dos últimos quatro anos, e compararam com o que Haddad ao fim conseguiu realizar – chegaram ao valor de 54,5% – uma exatidão na casa do décimo de porcentagem.

Consideraram para tal o que diz Oded Grajew, criador da ideia de Plano de Metas: “a meta só é atingida se a obra for entregue”.

Coisa para idiotas da obviedade.

(Texto originalmente publicado em www.jornalggn.com.br)

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