O professor Auto Filho, amigo que conhece bem a história desta terra, costuma referir-se a uma parcela da elite local como “incivilizada, arrogante e inculta”. Numa palestra dele, há uns vinte anos, ele disse isso a um auditório lotado de empresários e executivos e lembrou que os homens de negócio daqui tinham o hábito de dar aos filhos um carro, ao completarem dezoito anos, quando deveriam dar-lhes uma biblioteca, como fazem os empreendedores bem sucedidos de outras paragens mais, digamos, evoluidas. E, ainda falando ao público, ele disse que nenhum homem rico da sociedade cearense tinha feito uma obra social ou realizado uma ação cultural digna de nota.
Disse-lhe, reservadamente, imediatamente após a palestra, que ele cometera uma injustiça com o empresário local que criou a primeira instituição de ensino superior privada. E a fez grande desde o primeiro instante. Nasceu universidade e nem precisa dizer das coisas boas que vieram na esteira do tempo (estrutura física horizontal sustentável, belos jardins, teatro, uma senhora biblioteca…). E dava lucro. E não importava se houvesse benefícios fiscais. A Unifor, por Edson Queiroz, a minha universidade.
O professor Auto Filho estaria numa lista dos três intelectuais mais admirados desta terra, se houvesse uma lista. Sua trajetória de pensador e de realizador é marcante, como gestor público, como militante político, como jornalista, como professor…Auto Filho faz história, sabe pensar e sabe fazer. Tão ou mais admirável do que ele é a sua biblioteca, como ele, difícil de adjetivar. Quem teve a distinção de ser convidado a conhecê-la, sabe do que falo, e sabe que não exagero.
Faz tempo, numa conversa informal, ele, depois de ler um texto meu com dez sugestões para a cidade de Fortaleza, deu-me a ideia de seis bibliotecas municipais, que tomo a liberdade de oferecer como sugestão aos que se candidatarão a dirigir Fortaleza nas eleições deste ano.
Numa prova de que o candidato/a acredita no futuro desta terra, acredita na juventude e acredita na educação, o próximo/a prefeito/a deveria montar seis bibliotecas com um total de um milhão de livros nas seis regiões em que está dividida a cidade. O argumento é evidente: os livros moldam o caráter de jovens de todas as idades, reforçam a qualidade da educação e a civilidade da convivência, enriquecem a cultura, fazem pessoas melhores, contribuem para haver cidadãos conscientes, dão beleza à vida, dão vida às ideias, ensinam a ler, a pensar e a agir e reagir, a debater e a escrever, a conhecer o passado e construir o futuro, a conhecer-se e a ter empatia e respeitar o outro. O ambiente dos livros e o hábito de frequentar bibliotecas são necessários, úteis e saudáveis. E nenhum avanço tecnológico vai mudar isso. Aliás, os avanços tecnológicos reforçam e multiplicam todos esses benefícios, abrindo mil e uma possibilidades para projetos inteligentes, modernos, criativos. Bibliotecas do futuro.
O amigo lembrou de sua palestra e do comentário feito após o final. E sugeriu que os candidatos se comprometessem com a ideia e que usassem todo o seu poder de convencimento e articulação para, se necessário, obter o apoio dos empreendedores mais bem sucedidos localmente e que, segundo uma revista estrangeira, alcançaram os doze dígitos em suas fortunas.
O investimento é proporcionalmente pequeno, irrelevante, o retorno é que é gigantesco. E para sempre, como os diamantes.
Pronto, a ideia está lançada.