ESCUDO – Dimas Macedo

Deus mudou de residência

 

quando eu o procurei no meu corpo.
Eu o quis novamente no cérebro
e ele já se havia plantado na alma.
Ele tinha sossegado o meu busto.
Ele fazia escrituras nos dedos
e acariciava os meus olhos
que viviam completamente tontos de enganos.

 

As minhas miragens morriam
quando ele chegou muito perto e me disse:
a luz é a que fica gravada na memória,
e o sol é o que nasce brilhando a cada dia,
pois a tua honra e a tua lâmina,
pois a tua glória e o teu escudo
são essas rugas de paz
e essas dálias brancas
e essas tardes mágicas
e essas plantas nobres
que se deixam cair na correnteza.

 

E Deus já se havia chegado
por entre os fios do sonho
e se havia anunciado leve
como as espumas e os cristais de rocha,
mas ainda não se havia desnudo,
porque as marcas ficam na alma,
porque o vórtice e as vértebras
às vezes me levam para a morte.

 

Mas a luz de Deus chegou
para ficar dançando no silêncio
e o silêncio
para ficar gravado nas palavras
e as palavras para serem
faladas para o próximo,
porque no próximo o instante,
porque no próximo o quadrante
e as sarças de fogo da espera.

 

O amor não se compraz no pranto.
A alma é como a música do bosque.
Porque maduro e belo é o encanto
dos que se vão serenos pela vida.

 

E Deus mudou de residência na mente.
E ficou comigo na frente do espelho.
Deus e suas vestes toscas de cambraia.
A carregar nos braços minha sombra
e a carregar a nuvem dos meus passos.
A me vestir de linho na varanda.
A me jogar confete no espírito.
A me fazer escravo do seu jogo.
A me dizer que o mundo é uma festa
quando se tem a paz e a dor é branda.
Quando se vive sozinho no deserto
buscando o amor / sentindo a esperança.

Dimas Macedo

Poeta, jurista e crítico literário. Professor da UFC.

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