ENVELHECI, E DAÍ?

O mundo não parou. Nem eu. Ainda sinto o sabor do café quente, o aroma fresco da manhã. Os livros continuam a me encantar, assim como as conversas e o brilho de um novo dia. Os planos talvez não sejam mais tão distantes, mas ainda existem. O prazer agora tem outro ritmo, outra cadência. E isso é bom. Desacelerei para enxergar o que de fato tem valor.

 

No espelho, vejo as rugas. Elas já não me assustam. O rosto da juventude ficou nas fotos, e que bom que ficou. Olho para aquela jovem e agradeço. Ela me trouxe até aqui. Hoje, este rosto é aquele que sabe das coisas, que entende o valor de um riso despreocupado, de uma palavra dita no tempo certo, de um silêncio que traz paz.

 

Envelheci. E com isso veio uma liberdade que o jovem nem imagina. Não preciso mais provar nada. Não há mais padrões que me sirvam. A pele pode ter perdido firmeza, mas a vida ganhou profundidade. O que antes era pressa, virou calma. O que antes era insegurança, virou certeza. O amor, antes um fogo intenso, tornou-se uma brasa constante, aquecendo cada gesto.

 

Na velhice, o prazer também amadurece. Não é mais sobre o êxtase imediato, mas sobre o conforto de um corpo que se conhece, que se acolhe. O toque é mais sutil, mais pleno. A intimidade agora é uma dança entre memória e presença. Quem compreende as cicatrizes e as marcas do tempo entende o que de verdade faz diferença. O prazer profundo não é para quem desconhece o caminho percorrido até aqui; esse pertence aos mais jovens. Há mais segurança em compartilhar a jornada com quem esteve presente em todos os passos.

 

O segredo de envelhecer bem é simples: desejar o que se pode alcançar. A juventude quer tudo, mas não sabe como. A velhice sabe tanto, mas já não precisa, ou não deseja tudo. Esse equilíbrio é valioso. Não se gasta energia em sonhos inalcançáveis, só em apreciar o que ainda está ao nosso alcance. A cada ano que passa, os pensamentos se afinam, as ideias se tornam mais claras. O que antes parecia confuso agora faz sentido. Não há tempo para bobagens, fingimentos ou dramas desnecessários. Só o que toca, o que move, o que tem real significado.

 

 

Sim, envelheci. E daí? O mundo ainda está aqui, e eu também. O tempo não me derrotou, ele me esculpiu. E enquanto eu respirar, sentir e me encantar com o agora, há sempre mais para viver. A vida é este momento, e sempre foi.

Monica Moreira da Rocha

Economista, servidora pública aposentada, ex-auditora da Receita Federal do Brasil.

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