As eleições de 2018 como “solução nacional”, por Cesar Monatti

O peso das eleições presidenciais de 2018 nas análises, debates e manifestações em geral deste momento sobre as possibilidades de resistência ao golpe parecem superestimadas, quando são considerados com atenção os desdobramentos da eleição passada.

Vários questionamentos poderiam ser levantados, mas, para argumentar sobre o tema, é suficiente o principal deles.

Assuma-se, por hipótese, que a improvável candidatura de Lula consiga superar toda a guerra midiático-judicial que está a enfrentar, ou, numa versão mais realista, que ele, ainda que artificiosamente tornado inelegível, consiga indicar e ajudar a eleger com seu carisma uma liderança alinhada com que o substitua.

O que garante que o resultado das eleições será respeitado e que se acabará a instrumentalização do ministério público, do judiciário e das outras instituições que conduzem e sustentam o golpe?

A simples proposição dessa dúvida suscita uma contradição tão evidente da aposta política numa recuperação do país a partir dos resultados da próxima votação para presidente, que faz pensar nos porquês de que a possibilidade de ganhá-la possa ser considerada como “a solução nacional”.

Os exemplos da história contemporânea descrevem poucas formas de se combater um golpe de estado, que não seja por via da articulação e força de um contragolpe de mesma intensidade e em sentido contrário.

No Brasil, embora o suicídio de Vargas seja consagrado como um meio paradoxalmente definitivo e surpreendente de contragolpe, é, por óbvio, um tipo irrepetível de resistência e, mais grave ainda, como se comprovou dez anos mais tarde, mesmo que neutralizante no momento em que se deu, teve caráter apenas protelatório.

Por outro lado, o exemplo de contragolpe bem sucedido mais próximo no tempo e no espaço – na América do Sul, em 2002 – teve condições completamente diversas daquelas que estão estabelecidas hoje no Brasil.

Atribui-se o êxito daquele contragolpe ao imediato repúdio internacional ao golpe e ao massivo movimento de cidadãos nas ruas apoiando e exigindo a volta do chefe de estado substituído por um líder empresarial instalado no poder por forças reacionárias, entre elas, a mídia empresarial privada.

No caso brasileiro atual, tanto o apoio internacional à volta da presidenta eleita quanto os movimentos sociais de rua foram débeis ou contidos até recentemente, e a luta da própria ocupante do Planalto tomou caminhos mais formais e institucionais, num quadro acelerado de aparelhamento e degradação total daquelas, do que os da liderança política dos seus apoiadores.

Apenas muito recentemente, já com o quadro de metástase do golpe num estágio muito avançado, é que estes ingredientes indispensáveis à resistência e, portanto, ao contragolpe têm sido agregados ao discurso das principais lideranças golpeadas e à reação das camadas organizadas da sociedade mais prejudicadas pelo furor dos golpistas contra direitos individuais e o conceito de estado de bem-estar social.

Por isso, não parece haver dúvidas de que as bases da construção de uma resposta vigorosa e  consequente à imposição deste quadro institucional caótico estão para muito além da atuação apenas em direção às eleições de 2018. Na verdade, elas passam pelas lições de dois grandes e destemidos combatentes pela democracia.

Para reconduzir-se o país aos caminhos do desenvolvimento inclusivo, fundamentais são a lição do ex-Ministro da Justiça Eugênio Aragão que nos diz que “não se faz oposição a governo golpista, governo golpista se combate” e a do Prof. Wanderley Guilherme dos Santos que, com o entusiasmo que o caracteriza, vaticina: “o golpe exige um ‘contragolpe’, no sentido de restabelecer as bases do sistema democrático”.

Artigo de Cesar Monatti, aposentado, originalmente publicado em Jornal GGN.

Convidado

Artigos enviados por autores convidados ao Segunda Opinião.