Os jornais de segunda amanhecem coloridos de tanta festa: a proximidade do carnaval e a explosão de pré-carnavais na cidade e no País trazem a alegria nas marchinhas e nos blocos espalhados por aí afora. Enquanto isso, as comunidades pobres, moradoras da periferia e como tal abandonadas, não veem razão para comemorar. Em Fortaleza, há uma semana houve uma chacina propagada no mundo todo com a execução de catorze pessoas que não tiveram a menor chance de se defender e foram acuadas e mortas sem segredo, no meio da rua. No ano passado outra chacina com onze mortos noutro bairro da periferia também foi notícia.
Mas ficam algumas perguntas: será que esses acontecimentos não nos tornam acostumados com a violência? Seria a banalidade do mal de que fala Arendt? O fato vira notícia, as autoridades se reúnem, discutem e depois?
A desigualdade social salta aos olhos em cada esquina e não se vê a implementação de políticas públicas que antevejam fatos como o ocorrido no Barroso, embora eles sejam mais frequentes do que se imagina, embora em menor intensidade.
Não é raro saber de alguém que foi surrado por que tirou uma foto com uma pose comprometedora, ou ainda parou de ir para a escola por que foi ameaçado de alguma forma por vizinhos inseridos no tráfico. O comportamento dos indivíduos, pobres e ricos, tem sido ditado por movimentos criminosos. Todos sofrem, mas existem diferenças nesse sofrimento: o rico assaltado blinda seu carro e reforça a segurança no condomínio, o pobre assaltado passa o resto do ano pagando o celular que foi parcelado de dez vezes e era o seu único acesso à internet, a única maneira de se sentir pertencente ao mundo atual. Tinha facebook, what zap, e-mail, fazia prints e tal.
Enquanto isso os poderes públicos discutem em seus gabinetes a reforma da previdência, o armamento da guarda municipal, a teórica repactuação social.
Lembro o que li de Amartya Sen, Premio Nobel de Economia, sobre a necessidade de se praticar a democracia e compreendê-la como um conjunto de oportunidades que devem ser corretamente exercidas, com informação, discussão e possibilidade de participação. Quando pensaremos sobre as chagas sociais que nos incomodam? Pode ser depois do carnaval, na quaresma, entre o jejum e o bacalhau.