Duro de Matar (1988), dirigido por John McTiernan, é um dos maiores filmes de ação de todos os tempos. É claro que referenciá-lo apenas à década de 1980 é limitá-lo a um recorte cronológico muito pequeno. E esse que é o terceiro longa-metragem de McTiernan, traz uma série de elementos que o colocaram na história do cinema como um dos mais vigorantes trabalhos da cinematografia de gênero norte-americano.
Falar disso é importante porque o filme pode ser analisado sob a ótica de uma produção que investiu em uma estória cujos traços narrativos trouxeram uma série de pequenos detalhes quando a comparamos a outros longas de ação lançados naquele mesmo período.
Aqui, o então ator de comédia da TV americana, Bruce Willis, interpreta John McClaine – qualquer coincidência com McTiernan é coincidência referencial – um policial de Nova York que enfrenta um grupo de 30 terroristas que tomam um edifício localizado em um centro empresarial de Los Angeles.
Apesar de parecer, em um primeiro momento simplista, Duro de Matar foi desenvolvido de uma forma e sentidos cinematográficos memoráveis. A começar pela concepção de seu protagonista como uma linha mestra do personagem que evoca um sentimento de empatia forte por parte do espectador. McClaine não é um brucutu musculoso que se utiliza da força como válvula conectiva entre quem assiste à estória.
McTiernan chegou a convidar Arnold Schwarzenegger e Sylvester Stallone para o papel, mas ambos recusaram. E esse é um ponto crucial do filme porque a corporeidade desses atores dariam um tom totalmente diverso ao que tivemos em contraposição à performance de Willis. Uma vez que é a interpretação dele e sua corporeidade que dota McClaine de vida. Sendo um dos personagens mais particulares da história do cinema de ação.
Jonh é o inverso dos tipos de Stallone ou “Schwarzer”. É um caractere com muita densidade para o gênero. E se aproxima de nós por ser um tipo crível, que opera de modo naturalista e que assim como nós mesmos, é um ser vulnerável, mortal. E é por isso que vamos com ele até o fim. Andar por andar do Nakatomi Plaza.
Ele é quase uma personagem desromantizada, se considerarmos as figuras às quais o cinema de gênero é construído. Essa desromantização é percebida de modo simples, mas não simplista, com que John é apresentado.
Estamos diante de um policial que tem fobia de avião, dificuldades na relação com a esposa e que durante os 130 minutos de filme faz uso apenas de uma regata branca e uma calça. Sem sapatos, McClaine é oposto do herói invencível, ele é falível. E isso é o que o torna uma personagem tão marcante na historiografia do gênero ação.
Mas essa forte caracterização não se faz somente pelo papel de Willis. Há no filme toda uma teia de personagens que figuram na narrativa como elementos indispensáveis para o desenvolvimento da trama. Um desses nomes responde pelo vilão, Hans Gruber, interpretado pelo brilhante Alan Rickman. Aqui, Rickman faz uma atuação que se complementa com o refinado roteiro no qual cada personagem figura. Gruber é perspicaz, sofisticado e possui motivações muito bem definidas, dentro da estória naturalista que o longa nos sugere.
Aliado a Rckman, temos outros nomes como os da esposa de McClaine, Holly McClaine (Bonnie Bedelia); o oficial Al Powell, interpretado pelo carismático Reginald VelJohnson, além dos capangas de Hans, com destaque para o truculento Karl (Alexander Godunov), que cria uma subtrama a partir de um desejo particular de vingança contra McClaine.
Juntos, esses caracteres criam uma base dramatúrgica que projeta a ideia inicial do quanto a personagem de John precisa de apoio para a resolução dos problemas que lhe são colocados nos diferentes segmentos da estória. Nosso protagonista não é o tipo “faz tudo sozinho”, e os demais nomes da narrativa atestam isso. E por isso mesmo são igualmente relevantes na trama.
Mas entrando no terreno da forma, olhar para Duro de Matar é perceber como o som é um elemento-chave para a condução dessa estória. A trilha sonora original do filme nos conduz a uma positiva experiência do cinema como técnica. Onde a música rompe o caráter tecnicista enquanto elemento de apoio, para então se tornar verdadeiramente um dos fios condutores da narrativa.
Reverberando nos momentos de maior tensão, como percebemos nas sequências de tiroteios. E silenciando nos instantes de forte carga emocional, quando do momento em que McClaine encontra seu inimigo, Hans, sem saber que esse é o homem a quem tem de deter.
Esses são tópicos que em um primeiro momento podem parecer aleatórios, mas não o são. Na verdade, esses são todos os pontos que fazem um bom filme de gênero. É o elenco formado por atores empenhados em dar vida aos papeis assumidos. Assim como o entendimento da equipe de realização disposta a criar novas camadas dentro de um circuito que em sua maioria precisa ser analisado sob uma ótica contextual.
Com 28 milhões de dólares, McTiernan criou em 1988 uma obra crível, vigorante e tecnicamente irrepreensível. Com 98. Milhões, John Moore realizou Duro de Matar: Um bom Dia para Morrer (2013). E se aquele é uma obra-prima da ação, esse nada mais é do que uma esquecível produção. Logo, não são o tamanho das cifras que fazem o julgo do fazer fílmico em sua excelência. Porque a arte precede isso.
E é por essas e tantas outras razões que Duro de Matar figurará para a posteridade como um dos melhores exemplos de como o gênero pode se inventar por meio de realizadores que aliam saber cinematográfico com experiência de cinema enquanto indústria. Ele não se trai, assim como os tantos longas de Hollywood se perdem na evanescência da criatividade. É por isso que esse longa é um exemplo do mais virtuoso estar do cinema de gênero.
FICHA TÉCNICA
Título Original: Die Hard
Tempo de Duração: 131 minutos
Ano de Lançamento (EUA): 1988
Gênero: Ação, Crime, Thriller
Direção: John McTiernan