Disputa cultural, por Gilvan Mendes

Qual é o objetivo da política? Essa é uma pergunta que tem a resposta modificada com as mudanças de conjuntura. No século XVI, Maquiavel viu na conduta dominante do Príncipe a solução política mais eficaz para lidar com as dificuldades da fragmentada Itália, Marx, nos anos posteriores à revolução industrial, via a sociedade de mercado e a democracia representativa como meros aparelhos ideológicos da burguesia, deixando de lado o otimismo liberal de Tocqueville, que acreditava no avanço da democracia e na resolução dos seus males. O objetivo final da política se modifica de acordo com os contextos sociais e as percepções públicas de cada população em diferentes épocas.

Nesse sentido, é fácil perceber que no Brasil contemporâneo questões tidas como ”identitárias”, que buscam maximizar a identidade declarada de um indivíduo ou um grupo, estão ocupando a cena principal dos debates políticos. Emancipação feminina, direitos para a população indígena e LGBT, reflexões sobre representatividade e privilégios, entre outras ações, formam a grande meta política para uma parcela significativa da população brasileira nos dias de hoje. Daí nasce o contestado‘politicamente correto”, além da oposição conservadora que busca fortalecer pautas como combate ao aborto e críticas à dita”ideologia de gênero”. 

Se entendermos que a realidade brasileira precisa de reformulações, faz sentido mostrar interesse em certos debates e pautas desses movimentos contestatórios, realmente precisamos de mais igualdade entre homens e mulheres em áreas como o mercado de trabalho, e é um absurdo, em um país multicultural como o Brasil, ter tão poucos negros e pardos ocupando cargos importantes no cenário nacional. Ademais, no mundo reflexivo que vivemos hoje, não faz o menor sentido se sentir ofendido ou escandalizado com a orientação sexual de quem quer que seja.

É claro que questões ”universais” como segurança pública, combate ao desemprego e corrupção ainda devem permanecer como elementos centrais para refletir sobre o Brasil e os seus desafios. Mas devemos nos acostumar cada vez mais compoder cultural das disputas grupais, que são significativas na atual era digital.    

Gilvan Mendes Ferreira

Cientista social graduado pelo Universidade Estadual do Ceará-UECE, com interesse nas áreas de Teoria Política , Democracia e Partidos Políticos.

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