Desprivatização da Petrobrás e as falácias do PT

Um escândalo bem maior, mais escabroso e profissionalizado

Ao enfrentar sua primeira grande crise ao chegar ao poder, no caso do escândalo do mensalão, o PT usou como uma de suas estratégias a disseminação de falácias para formular uma opinião púbica que o colocasse como vítima de uma conspiração golpista de uma direita udenista, mas sem entrar no mérito das acusações. Todavia, as falácias inventadas não suportam o confronto ligeiro com as práticas do partido no comando administrativo da coisa pública no país. Diante do escândalo do mensalão, o PT criou as seguintes falácias: i – o governo petista não rouba e não deixa roubar; ii – tem gente incomodada com o sucesso do governo Lula; iii – o governo Lula é um governo republicano; iv – não existe mensalão e nem caixa dois, o que existiu foi o uso de recursos não contabilizados.

Depois da condenação de alguns petistas pelo Supremo Tribunal Federal, o PT passou a defender a tese de que não existiu mensalão, nem caixa dois, que os condenados eram inocentes e políticos perseguidos. Porém, não moveram uma palha em defesa do núcleo de gestão econômica do mensalão, como no caso do senhor Marcos Valério, que continua preso por uma coisa que, segundo o PT, não existiu. === Diante do novo esquema de corrupção, agora na Petrobras, um escândalo bem maior, mais escabroso e profissionalizado, o escândalo do dólar na cueca é visto como uma operação de amadores ou um ato artesanal. E o PT ainda defende-se com novas falácias, vejamos:

1.ª – “A corrupção na Petrobras é anterior à chegada do PT ao poder”. E pelo que vem sendo delatado na Operação Lava Jato é. Mas se os roubos na Petrobras é uma herança maldita recebida do governo tucano, por que o PT não fez uma auditória e ofereceu uma denúncia ao Ministério Público, ou tomou as medidas cabíveis para punir os culpados e ressarcir a empresa? Será que, ao longo desses 13 anos na administração da estatal, a realização dos balanços anuais feito pela direção petista não identificaram os rombos do governo anterior? Por que o silêncio do partido diante da situação que encontrou na Petrobras? Por que continuaram durante os governos Lula e Dilma os esquemas de propina?

Imagine uma pessoa que foi assaltada uma vez e resolveu não registrar o roubo na delegacia. Essa mesma pessoa foi roubada uma segunda vez e, ao ter elementos para identificar o ladrão, resolveu apresentar queixa. O acusado argumenta, em sua defesa, que a vítima já havia sido roubada outra vez e o ladrão não tinha sido punido, então, ele também não poderia ser punido, pois a punição configuraria um ato injusto, já que o primeiro ladrão não foi penalizado. O PT é o segundo ladrão, que acha que é injusto ser punido por atos de corrupção que outros cometeram antes dele, mas que não foram punidos. Com essa argumentação falaciosa, os petistas naturalizam tanto a corrupção quanto à impunidade como ato normal. E ainda dizem que tal ato constitui uma cultura política que não deve ser mudada, pois, se o PT for penalizado, será por força de uma perseguição política por parte de setores conservadores ou de golpistas.

2.ª – “A mídia golpista alimenta sua agenda com a Operação Lava Jato para que o PSDB possa defender a privatização da Petrobras atendendo aos interesses de corporações estrangeiras”. Todavia, o que a Operação Lava Jato tornou público foi a existência de um esquema envolvendo a Petrobras e algumas das maiores empreiteiras do Brasil, o chamado Clube, a partir do qual se operava o pagamento de propina que variava ou varia de 1% a 5% dos valores negociados. Os valores dos principais contratos investigados somam 59 bilhões de reais. Parte do dinheiro obtido com as fraudes era distribuído entre o PP, PMDB e o PT, e, supostamente, era para financiar campanhas políticas. Segundo o delator Pedro Barusco, ex-gerente de engenharia da Petrobras, só o PT recebeu entre 150 a 200 milhões de dólares [O Povo, 5/2/15]. Ora, a Petrobras já está privatizada por essa quadrilha ou clube composto de empreiteiras e partidos políticos, não se trata de privatizar, mas de desprivatizar. Para que a Petrobras possa ser desprivatizada, as investigações têm que ir até o fim, os culpados devem ser punidos e a empresa deve passar por um processo de transparência e controle público.

3.ª “Há por parte da Operação Lava Jato uma tentativa de criminalização de repasses legítimos de dinheiro”. Nessa falácia, criada pelo presidente nacional do PT, ele acaba afirmando, de forma indireta, que o PT recebeu recursos das empreiteiras que fazem parte do clube que operava ou opera o esquema de corrupção na Petrobras, mas que o dinheiro recebido foi repassado de forma legal. Portanto, há corrupção na Petrobras, mas o dinheiro que as empreiteiras ganham com o superfaturamento foi legalmente para o partido e isso não é crime. E o presidente nacional do PT vai mais além, diz ele: “doações legais de fornecedores de estatal beneficiaram os principais partidos do país”. Imagino que ele queira dizer que isso é normal, não é crime, e que se for para punir, tem que punir todos. Essa relação de empreiteiras que financiam partidos e passam a ser fornecedoras de estatal, ou que passam a ser fornecedoras de estatal e financiam partidos, não é um ciclo vicioso de corrupção em nossa cultura patrimonial?

Bem, essas três falácias em torno do escândalo na Petrobras se articulam de forma a revelar o rosto de um partido degenerado e um sistema político que vive apenas para alimentar a disputa do poder e de interesses de rentistas e extrativistas, e de outros setores menores do capitalismo brasileiro. Sem projeto para o país, mas como servidores do mercado, seja na sua forma branda ou perversa, PT e PSDB passaram a disputar quem é o mais corrupto. Cada um vai assumindo a posição do outro, conforme o local onde se colocam. Quando governo, diante dos vários casos de corrupção que se tornaram públicos, o PSDB se dizia inocente, e que os pedidos de impeachment defendidos pela CUT e o PT era coisa de golpista. O PT, no poder, passou a roubar de forma aloprada e responde à oposição e à sociedade com os mesmos argumentos do PSDB.

Diante dessa conjuntura, tornou-se esdrúxula a posição de pessoas que se dizem de esquerda, alguns até socialistas, de achar que o PT é inocente e vítima de uma conspiração, que se trata de uma luta da direita contra a esquerda, e que o PT ainda representa algo contra o conservadorismo na nossa sociedade. É evidente que existe um avanço do conservadorismo no Brasil, mas não é achando que o PT é inocente que vamos enfrentar o conservadorismo e avançar rumo a uma cultura política emancipatória. Defender o PT é defender a corrupção e oferecer espaço e argumentos para o avanço do conservadorismo. Alguns militantes, presos afetivamente à estrutura partidária ou a cargos que mantêm o sustento material deles, podem defender o partido por motivos óbvios, mas os que acreditam que, internamente, o partido ainda tem um projeto a ser disputado, que ele pode voltar às origens, caem na ingenuidade. O PT é um partido degenerado, não tem volta. Não existe um exemplo na história de partido que, após se degenerar, tenha feito autocrítica e voltado às origens. Quando um partido se degenera, acaba-se ou passa a ser aquilo em que se transformou. O momento atual é propício, sim, para investir numa nova cultura política e investir no PODEMOS brasileiro, de investir em alternativas políticas que respondam ao desafios atuais de crise de representatividade.

Uribam Xavier

URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.

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URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.