ARTE TAMBÉM É PARA BRINCAR

A arte tem fascinado os homens desde que o primeiro primitivo contemplou as estrelas. Estabeleceu-se ali um momento de magia que deve ter encantado e causado um certo estranhamento ao nosso ancestral. Daquele momento em diante, a evolução do homem tem possibilitado inúmeras manifestações artísticas. O homem aprendeu a criar com o objetivo de embelezar a realidade que o cercava. Das pinturas rupestres à arte midiática, auxiliada pelo computador, o homem experimentou várias formas de produção artística. Representou seu sentimento em forma de estesia diante da natureza, da realidade ou da imaginação criadora. Enfim, deu vida e formas às possibilidades do belo.

Embora saibamos que a arte é uma necessidade do homem, desde os primeiros momentos em que utiliza os seus sentidos, a sua evolução biológica vai aos poucos lhe subtraindo deste prazer que poderia ser compartilhado pelo exercício da arte. Falo em exercício como hábito de incorporar o deleite artístico como instante de meditação. E a arte aí não teria enfim o seu papel pedagógico, de educar esteticamente o homem, depurar-lhe a tosquidez do espírito?

Quem sabe Herbert Marcuse, ao encarar a arte no contexto das relações sociais prevalecentes, atribuindo-lhe uma função política, não tenha oferecido aí uma possibilidade da arte como revolucionária?, assim apregoa o pensador no seu livro A dimensão estética. Daí por que o descaso de governos para com a difusão das artes nas escolas ser um sintoma desse medo de educar pela arte. Medo de que o homem seja liberto dos preconceitos e dos brutais sintomas de alienação artística.

Essa pequena reflexão sobre a arte como processo na formação estética do homem veio como reação ao excesso de burocracia que tomou conta dos estados modernos, dos mais recentes “favores” do neoliberalismo, que quer criar o estado mínimo, livrando assim os governos, grosso modo, do peso dos direitos e deveres junto ao cidadão. 

Tenho em mente agora o poeta Charles Baudelaire, errático nos boulevares parisienses, contemplando a onda humana que caminha aparentemente sem destino, interpretando em seus poemas uma cidade transformada pela arquitetura e pela máquina. Não seriam os poetas os melhores educadores para este século 21? Quem leu A educação estética do homem, do poeta alemão Schiller, deve se perguntar meio atoleimado: Quer dizer que em poesia tem filosofia, psicanálise, sociologia, antropologia, ciência em estado subjetivo? Puxa vida! E eu aqui enriquecendo a estupidez humana com ofícios, dados numéricos, entrando em comissões para discutir a esterilidade do burro, reuniões que nunca cumprem as suas pautas etc., etc.

Melhor seria brincar um pouco com um poema:

 

PRA QUE PENSAR?

 

há pessoas que sonham que pensam

são tolas

há pessoas que pensam e nem sabem

são absortas

há pessoas que, quando pensam que estão pensando

e nem sequer imaginam que não deveriam pensar,

incomodam

incomodam como o pensamento dos tolos e dos absortos

quem quiser pensar que pensa, que pense

pode até brincar, eu nem ligo

não me preocupo

para que pensar nisto?

ora bolas!

para que pensar???

 

 

Carlos Gildemar Pontes

Poeta, ficcionista e Editor da Revista Acauã. Professor da UFCG.

 

                                                                                       

Carlos Gildemar Pontes

CARLOS GILDEMAR PONTES - Fortaleza–CE. Escritor. Professor de Literatura da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. Doutor e Mestre em Letras UERN. Graduado em Letras UFC. Membro da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Foi traduzido para o espanhol e publicado em Cuba nas Revistas Bohemia e Antenas. Tem 26 livros publicados, dentre os quais Metafísica das partes, 1991 – Poesia; O olhar de Narciso. (Prêmio Ceará de Literatura), 1995 – Poesia; O silêncio, 1996. (Infantil); A miragem do espelho, 1998. (Prêmio Novos Autores Paraibanos) – Conto; Super Dicionário de Cearensês, 2000; Os gestos do amor, 2004 – Poesia (Indicado para o Prêmio Portugal Telecom, 2005); Seres ordinários: o anão e outros pobres diabos na literatura, 2014; Poesia na bagagem, 2018; Crítica da razão mestiça, 2021, dentre outros. Editor da Revista de Estudos Decoloniais da UFCG/CNPQ. Vencedor de Prêmios Literários nacionais. Contato: [email protected]

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CARLOS GILDEMAR PONTES - Fortaleza–CE. Escritor. Professor de Literatura da Universidade Federal de Campina Grande – UFCG. Doutor e Mestre em Letras UERN. Graduado em Letras UFC. Membro da Academia Cajazeirense de Artes e Letras – ACAL. Foi traduzido para o espanhol e publicado em Cuba nas Revistas Bohemia e Antenas. Tem 26 livros publicados, dentre os quais Metafísica das partes, 1991 – Poesia; O olhar de Narciso. (Prêmio Ceará de Literatura), 1995 – Poesia; O silêncio, 1996. (Infantil); A miragem do espelho, 1998. (Prêmio Novos Autores Paraibanos) – Conto; Super Dicionário de Cearensês, 2000; Os gestos do amor, 2004 – Poesia (Indicado para o Prêmio Portugal Telecom, 2005); Seres ordinários: o anão e outros pobres diabos na literatura, 2014; Poesia na bagagem, 2018; Crítica da razão mestiça, 2021, dentre outros. Editor da Revista de Estudos Decoloniais da UFCG/CNPQ. Vencedor de Prêmios Literários nacionais. Contato: [email protected]