Agora é com o Senado

O que é uma CPI? O artigo 58, § 3º, da Constituição Federal, estabelece que uma comissão parlamentar de inquérito tem o poder de investigação próprio das autoridades judiciais. São criadas pela Câmara Federal e pelo Senado, em conjunto ou separadamente, mediante as seguintes condições: 1) requerimento de um terço de seus membros; 2) para apuração de fato determinado;3) por prazo certo. Suas conclusões podem ser enviadas ao Ministério Público para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.

Na quinta-feira (8/4), o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que o Senado adote as providências necessárias para instalação da CPI voltada para apurar as omissões do governo federal no enfrentamento da pandemia da Covid-19. Na liminar o ministro destacou que a Constituição estabelece que não cabe omissão nem conveniência política por parte da Presidência da Casa Legislativa (Câmara ou Senado) para postergar a instalação de uma CPI, conforme diversos precedentes da Suprema Corte neste sentido: “não se pode negar o direito à instalação de uma comissão, cumpridas as exigências constitucionais para a sua instalação, sob pena de ferir o direito da minoria parlamentar”.

A reação do presidente da república foi imediata,extremamente perturbado, gravando para suas redes de milícias digitais, atacando vergonhosamente o ministro do STF: “Falta coragem moral para o Barroso e sobra ativismo judicial. O ministro do Supremo Tribunal Federal faz politicalha junto ao Senado Federal. Barroso, nós conhecemos teu passado, tua vida”.

Por que 31 senadores (quatro a mais do mínimo necessário) estão querendo investigar a fundo as omissões do governo federal, podendo indiciá-lo em crime de responsabilidade? Porque até ontem, 10/04, segundo os números oficiais, já eram 352 mil mortos, com a previsão de atingir o absurdo de meio milhão de mortes no final de maio.

Numa breve retrospectiva, um ano atrás, em 22 de março de 2020, depois de diversos médicos infectologistas terem afirmado que o governo federal brasileiro demorou bastante a reconhecer a gravidade da pandemia (o primeiro caso tornado público remonta a dezembro de 2019, com a OMS classificando em 20 de janeiro de 2020 o surto internacional como pandemia), sequer determinou a suspensão do Carnaval (22 de fevereiro foi o sábado de abertura do Carnaval). Bolsonaro disse textualmente: “Não temos que entrar em pânico. Você não pode comparar Brasil com a Itália (em 20 de março de 2020 a Itália já contava 4.032 mortos). O número de pessoas que morreram aqui de H1N1 foi da ordem de 800 pessoas. A nossa previsão é não chegar a essa quantidade de óbitos no tocante ao coronavírus. Brevemente o povo saberá que foram enganados por esses governadores e por grande parte da mídia.”.

Ainda em março de 2020, no dia 29, Bolsonaro cinicamente continuava insistindo conscientemente em aprofundar sua necropolítica, passeando sem máscara pelo Distrito Federal, incentivando a população a romper os cuidados de distanciamento social para conter a disseminação do coronavírus, descumprindo orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Ministério da Saúde, divulgando em suas redes sociais vídeos do seu passeio pelas cidades de Taguatinga e Ceilândia, provocando aglomerações.

Em abril de 2020, com medo do sucesso do seu ministro da saúde, demitiu-o como também o seu substituto, Nelson Teich, nomeando o general Pazuello para a Pasta. Com o alinhamento automático de Pazuello à sua necropolítica, Bolsonaro não criou o Comitê Gestor da Pandemia, com governadores e profissionais de saúde; continuou incentivando aglomerações; aumentou a propaganda do uso da cloroquina como medicação de combate à doença; confrontou governadores e prefeitos, principalmente no que tange à vacina desenvolvida pelo governo João Dória (SP); não celebrou contrato de compra de vacinas da Pfizer; não demitiu seu então chanceler quando este atacou publicamente a China (maior fornecedora de insumos para combate à Covid-19).

Em janeiro de 2021, o Supremo Tribunal Federal determinou a abertura de inquérito para apurar a omissão do ministro general Pazuello na crise sanitária de Manaus – AM, que sofreu o colapso do seu sistema de saúde devido à falta de oxigênio nas unidades básicas de saúde.

Portanto, fatos não faltam (e são muitos) para serem devidamente apurados. Se o Senado com esta CPI não investigar a fundo, será acusado pela história de cumplicidade com a necropolítica bolsonarista.

Além disso, Câmara e Senado têm diante de si outra decisão histórica. Tratam-se de projetos de lei que tramitam em ambas as Casas para a quebra temporária de patentes, permitindo facilitar o acesso a vacinas e medicamentos de combate à doença. Para isso, deputados e senadores terão de enfrentar o capital farmacêutico internacional (Big Pharma) nesse cenário de emergência nacional diante do gigantesco quadro de mortandade de brasileiros e brasileiras. Países explorados historicamente pelo colonialismo europeu sofrem pela dependência de megacorporações ao não liberarem o conhecimento de produção das vacinas, recurso essencial para o combate à pandemia. Os projetos são o PL 1.462/2020 (Câmara Federal) e PL’s 12/2021 e 1.171/2021 (Senado), todos obrigando os titulares de patentes a cederem temporariamente informações sobre a produção de vacinas e medicamentos de combate à Covid-19. Estes PL’sdeveriam ter sido votados no dia 07 de abril, mas foram retirados de pauta por solicitação do governo Bolsonaro.

Por fim, uma informação importante para os eleitores e eleitoras de Bolsonaro (sem partido). Com a política de privatização da Petrobrás desenvolvida pelo seu governo, o gás de cozinha já está custando até agora R$98,00 (noventa e oito reais). No final do governo Dilma Rousseff (PT), o gás de cozinha custava menos da metade, R$45,00 (quarenta e cinco reais). Com Dilma, você comprava dois botijões de gás por R$90,00 e ainda sobravam R$8,00 (oito reais). Agora, depois do jantar de Bolsonaro com os 20 bilionários brasileiros, vem muito mais bronca pela frente. É isso aí, um governo voltado para os bilionários.

Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Editora Dialética); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .