A vida como imperativo

Vive-se sem emprego, mas não existe emprego sem vida. A maioria dos trabalhadores no mundo vive na miséria, mas não existe patrão acumulando riqueza sem a exploração de mão de obra. O mercado tem a acumulação de riqueza como valor absoluto, o que se configura uma negação da ética, e fora dela não é possível colocar a vida como valor absoluto.

 

Depois de duas grandes guerras mundiais, do Nazismo, do Fascismo, da Guerra Fria e da queda do Muro de Berlim, ficou claro que o capitalismo é um sistema da morte. Sua existência tem como finalidade a barbárie, hoje tão bem visualizada na destruição da natureza, na concentração de renda e na situação de miséria e pobreza em que vive a maioria da população do planeta.

 

A concentração de renda no planeta é tão brutal que já se fala que 1% de ricos concentram em suas mãos 99% da riqueza produzida no planeta, e 99% da população trabalhadora divide apenas 1% de toda riqueza que produziu com o seu trabalho. Quem afirmou isso foi o movimento Occupy Wall Street, que eclodiu nos Estados Unidos em setembro de 2011 contra a crise estrutural do capitalismo. Portanto, no capitalismo não se vive para trabalhar, trabalha-se para viver miseravelmente até a morte. Mas, com a tecnologia substituindo o homem no processo de produção, muitos são descartados e sua presença no mundo se torna indesejada, um incômodo por exigir ações genocidas por parte do sistema.

 

A pandemia do coronavírus dividiu os capitalistas: uns logo perceberam que é melhor o isolamento social para depois voltar à normalidade, passando a ideia de que o mais importante é manter a força de trabalho viva, e o caminho mais seguro e rápido para sair da crise; e os  iracundos, que não admitem perder nada, que encontram na pandemia uma forma de descartar parte dos indesejados, mesmo que alguns dos seus entrem nas estatísticas, que se colocam contra o isolamento social, expressando as suas ganâncias na defesa da absolutização do mercado, que aparecem numa narrativa de defesa do emprego do trabalhador e do menor sofrimento para os pobres, como se os pobres não fossem uma produção da exploração do trabalho.

 

Bolsonaro tem razão, tem que se voltar ao trabalho. Sem exploração do trabalho não tem produção, e sem produção o patrão não acumula riqueza. Sem acumulação de riqueza não se pode dominar, perde-se a distinção e se abre caminho para se pensar outro sistema social e outras condições de vida. Tem que voltar a trabalhar, pois, mesmo que muitos morram, o importante é que o processo de acumulação de riquezas não pode parar. A vida não é um valor absoluto. Todavia, para uma razão ética, qualquer vida importa (planta, um rio, bicho, gente), e o dinheiro, a tecnologia e o saber devem ser disponibilizados para todos e submetidos ao império da vida sem custo, pois já foi produzido, pelo trabalhador, como efetivação da vida. A razão do Bolsonaro e de seus seguidores é uma razão genocida.

Uribam Xavier

URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.

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URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.