A sublegenda de Barbalha

Os festejos juninos na região Nordeste do Brasil são comemorados com muito ardor e originalidade, envolvendo a grande massa do povo nordestino em sua produção cultural, impregnada de expressões criativas que vão desde a culinária, passando pela dança, a música, pelas parlendas e adivinhações, pela alegoria de ambientes e de pessoas, de todas as faixas etárias, de gêneros, de etnias e socioeconômicas. A abertura se dá no dia 13, em homenagem ao santo casamenteiro e amigo dos empobrecidos, Antônio de Lisboa, atingindo seu ápice nas quadrilhas e forrós da festa de São João Batista, concluindo com as homenagens ao santo pescador São Pedro.

Mas além de festejos, o tempo junino é também um tempo político, no qual os grupos buscam intensificar a sua unidade interna para demonstrar ao público eleitor uma aparência de força e coesão, buscando assim penetrar o imaginário social com o objetivo de conquistar engajamento e devoção.

No município de Barbalha, no centro do Cariri cearense, o núcleo duro liderado pelo ex-governador Camilo Santana (PT) manteve esse roteiro ao participar de forma coesa das diversas manifestações pagãs e religiosas que dão início à quadra junina. Além de Camilo, compunham seu staff a governadora Izolda Cela (PDT), o deputado federal José Guimarães (PT), o presidente da Assembleia Legislativa deputado estadual Evandro Leitão (PDT), o vice-presidente da Assembleia Legislativa Fernando Santana (PT), a candidata a deputada federal Janaína Farias (PT), o deputado estadual Júlio César (líder do governo na Assembleia). Sentida a ausência do deputado estadual Elmano de Freitas (PT).

No lado diametralmente oposto, mais especificamente na capital alencarina, servidores e servidoras municipais estão recebendo um convite, em nome do presidente nacional Carlos Lupi, em diversos grupos de Whatsapp, para participarem de outro festejo, promovido pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT), a realizar-se no próximo dia 15/06, de 9h30 às 17h00, no Hotel Mareiro, com a presença de Ciro Ferreira Gomes, notadamente defensor inarredável da candidatura de Roberto Cláudio ao governo do estado do Ceará, defendida também ardorosamente pelo prefeito José Sarto. Neste agrupamento, pelo menos por enquanto, nenhum representante do legislativo petista – federal ou estadual – tem assento declarado, apesar de Ilário Marques (PT) ser secretário de Sarto.

Revisitando a história, vamos encontrar na ditadura militar (1964-1988), um evento inusitado, quando o partido – ARENA, que dava sustentação ao poder autoritário, ao sentir minguar nas urnas a sua prepotência, deflagrou uma aberração jurídica, implantada pelo AI-4 (Ato Institucional 4, de 07 de dezembro de 1966), ao instituir o uso de “sublegenda”, a qual permitia que concorresse ao mesmo cargo majoritário mais de um candidato pelo mesmo partido. A partir daí nascem a ARENA 1 e a ARENA 2, uma maneira de acomodar interesses das diversas forças políticas reacionárias que apoiavam a ditadura militar.

Um caso clássico ocorreu em Pernambuco, nas eleições de 1978. Pela oposição à ditadura concorria ao cargo majoritário do Senado o então jovem deputado federal Jarbas Vasconcelos (MDB); pela ARENA 1 disputou Nilo Coelho (da oligarquia Coelho, de Petrolina) e pela ARENA 2, o ex-governador Cid Sampaio. Resultado: apesar de Jarbas (MDB) ter obtido o maior número de votos, a soma dos votos dos candidatos da Arena 1 e Arena 2 era maior do que o dos votos do MDB, e assim foi declarado eleito o candidato da Arena 1, Nilo Coelho.

Nitidamente, este parece ser o jogo que está sendo jogado aqui no Ceará, nos tempos atuais, pela oligarquia no poder: a disputa entre sublegendas de um mesmo grupo. Não existe antagonismo. Apenas há a necessidade de acomodação dos interesses internos, para tudo permanecer na mesmice.

Alexandre Aragão de Albuquerque

Mestre em Políticas Públicas e Sociedade (UECE). Especialista em Democracia Participativa e Movimentos Sociais (UFMG). Arte-educador (UFPE). Alfabetizador pelo Método Paulo Freire (CNBB). Pesquisador do Grupo Democracia e Globalização (UECE/CNPQ). Autor dos livros: Religião em tempos de bolsofascismo (Independente); Juventude, Educação e Participação Política (Paco Editorial); Para entender o tempo presente (Paco Editorial); Uma escola de comunhão na liberdade (Paco Editorial); Fraternidade e Comunhão: motores da construção de um novo paradigma humano (Editora Casa Leiria) .

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