Não foram poucos os governos, alguns de confissão esquerdista, outros brotados de ditaduras, que se empenharam em desesperada e patriótica resistência à ameaça das “fake news”.
Na Revolução francesa, na vigência trágica do Terror, muitas cabeças revolucionárias rolaram para o cesto das cabeças guilhotinadas, castigadas com a suspeição de fabricarem intrigas e “fausses nouvelles”.
Danton e Robespierre foram condenados e executados e responsabilizados de traição pelas “fausses nouvelles” que espalharam…
Trotski fugiu para o México onde um militante comunista francês enfiou-lhe um machado nas ideias que trazia na cabeça. Perseguido, foi exorcizado pela incontinência de palavras e gestos impatrióticos contra a revolução dos sovietes.
A Comissão sobre Atividades Anti-americanas, Comissão McCarthy, foi criada pelo Senado Americano para apurar “fake news” sobre o governo americano. Artistas e intelectuais foram acusados, julgados, presos ou expulsos do território americano por crime de traição, por compartilharem notícias incertas e ideias falsas sobre o governo americano.
Na Idade Média, na França e Espanha,além de em outras nações católicas, a Inquisição assumiu o controle do combate contra a heresia, praticadas com falsas intenções de negar a verdade da fé cristã. A fogueira, além da tortura, foi a arma preferida pelos monges inquisidores para castigar os veiculadores de “fausses idées”. O corpo dos pecadores eram justamente queimados para a libertação das almas que os habitavam — da mentira dos hereges.
No Brasil, durante o Estado Novo, de saudosas penitências impostas aos que mentiam abusadamente sobre as intenções do ditador Vargas, a mentira era tratada como intenção subversiva, já que o Estado era dominado pela verdade indiscutível de um caudilho gaúcho.
Em 1964, não foram poucos os recalcitrantes políticos, criaturas que chafurdavam no pecado da mentira, cassados, processados e presos como subversivos da ordem, condenados por “falsas e perigosas ideologias”.
Professores e alunos foram afastados das suas mentiras, à medida que perderam a cátedra e tiveram as matrículas trancadas. Livros foram retirados das livrarias e bibliotecas por serem reconhecidamente fonte de mentiras, capazes de desviar as criaturas de boa-fé do bom caminho da verdade.
Pois agora, são os ministros togados e um candidato à presidência, já condenado por más palavras e intenções
duvidosas contra a verdade e o erário, que defendem tratamento severo, uma assepsia das mentiras acumuladas e proferidas “ad infinitum”, para limpar a mídia e as redes sociais das inverdades dos que mentem desavergonhadamente contra a democracia e o estado de direito, litania repetida contra os perigos das notícias e ideias mentirosas que ameaçam a nossa civilização.
Afogados em tanta mentira, tornamo-nos presas fáceis de uma tormentosa tempestade semântica, de falsos conceitos alimentados pela retórica ideológica dominante. Afinal, mentirosos são os outros. Os que não acreditam nas nossas mentiras.