O cólera, no caso, se refere a uma doença intestinal causada por uma bactéria, muito comum nos países pobres, que não impede a cena do amor tardio, mas realizado, e por ele narrado com a maestria do grande literato colombiano que é e que ganhou o Prêmio Nobel de literatura do ano de 1982 por sua magnum opus “Cem anos de solidão”.
O ser mercantil, que formatou a mercadoria, e concomitantemente foi por ela formatado, age de tal forma inconscientemente induzido pela avidez de obtenção do quase único meio de sobrevivência que formatou socialmente (trabalhar para ganhar dinheiro para comprar mercadorias em dinheiro), que o meio se transformou num fim em si, e passou a adorá-lo.
É evidente que todos nós gostamos e precisamos de um copo d’água para matar a sede; ou de um bom prato com alimentos bem temperados, que são substâncias concretas indispensáveis à sustentação da vida. Mas para obtê-las precisamos do dinheiro, algo abstrato, e é nesse momento e circunstância que passamos a idolatrar uma abstração numérica pelo simples fato dela ser o meio de obtermos o que precisamos.
O que é mais greve nessa forma de relação social estabelecida por critérios de sociabilidades negativos inconfessáveis, mas tidos equivocadamente como “facilitadores” de vida social, tal qual um Deus formatado pelos homens, é que a sua essência constitutivas intrínseca é desconhecida (porque esse segrego não lhes é esclarecido e ensinado), ou seja, amamos o nosso algoz sem conhecer a sua negatividade, tal qual um toxicômano que se ilude com a alegria inicial, momentânea e ilusória da droga entorpecente que vai lhe escravizar.
Costumo dizer que a mercadoria é uma droga; mas, coincidentemente, a droga é uma mercadoria. O traficante de drogas não consome a mercadoria que vende (que segundo o síndico Tim Maia, o Brasil é tão descolado da real que por aqui há traficante viciado), mas é com a dependência dos seus “clientes” a elas que realiza o objeto do seu interesse: o dinheiro e a acumulação do mesmo.
Só se pode explicar esse fenômeno se se compreender que é a dependência do eleitor ao valor (representado pelo dinheiro, a mercadoria especial, e única que não tem valor de uso, bem como pela mercadoria sensível, que tem valor de uso e de troca), inconsciente da essência de tal mecanismo, o fetichismo que faz com que ele queira assumir o lugar do seu escravizador a quem admira (o capitalista que age como gerente privilegiado do capital que o acumula e não quer e não pode distribui-lo) e desejar ficar rico.
Disse Giordano Bruno, frade dominicano italiano, a caminho da fogueira, em condenação da Igreja Católica pela acusação de crime de heresia contra a teologia, já em 1.600: “que ingenuidade pedir a quem tem poder para mudar o poder”.
Exemplo de beleza da arte revolucionária é a estética que narra a beleza do sentimento contra a crueldade da truculência do regime de exceção expressa pela arte cênica, com Fernanda Montenegro e sua filha Fernanda Montenegro, no filme “Ainda estou aqui”, de Walter Salles, que é um forte libelo acusatório contra aqueles que ousaram matar premeditadamente em nome da “defesa da democracia” e obedientes ao comando da chamada “operação condor” orquestrada pelos Estados Unidos para a América do Sul.
Mas para confirmar a força do sentido da beleza como capacidade transformadora, por paradoxal que pareça, um filme que aborda uma prisão seguida de morte por militares a um parlamentar que naquele momento era são e indefeso, é mais a história de uma família carioca (é locado na beleza natural de paisagem deslumbrante da cidade do Rio de Janeiro) de classe média com seus dramas e seu significado para os dias de hoje. Maravilhoso.
Agradeço ao Alder Teixeira, pelo resgate da frase de Fiodor Dostoiévski na qual ele diz que “a beleza salvará o mundo”. Ora, do ponto de vista filosófico, a beleza é gênero do qual muitas espécies de virtudes nela se inserem, e entre elas o afeto que distingue o ser humano sensível do insensível.