007 – Quantum of Solace: E a relevância de um Bond referencial

Há 10 anos, a Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) lançava aquele que seria o 22º filme da franquia 007 e o 2º na Era Daniel Craig. Em 2008, portanto, era lançado “007 – Quantum of Solace”. O longa é usualmente considerado, sobretudo pelo público, como um dos filmes menos prestigiados na cinquentenária lista das obras que adaptam os romances de Ian Fleming. Uma injustiça, claro. E isso se justifica por uma série de questões. Sobre elas é que falaremos a seguir.

Dirigido por Marc Foster, o longa narra os eventos que sucedem diretamente “Cassino Royale” (2005). Aqui, James Bond (Daniel Craig) busca pistas que o ajudem a desvendar os mistérios que envolvem a morte da sua namorada, a agente infiltrada Vesper Lynd (Eva Green). As trilhas desse caso particular levam o agente secreto ao encontro dos planos de uma perigosa organização que financia planos para deposição de governos ilegítimos da América Latina.

Na lista de filmes que compõem as obras interpretadas por Daniel Craig, este é o trabalho mais enxuto, até então. Tanto em termos de elementos constitutivos da sua narrativa, quanto do próprio tempo de duração em termos cronológicos. Em 1 hora e 46 minutos, vemos Bond tentando desvendar os planos da organização, que tem no magnata Dominic Greene (Mathieu Amarilc) um esguio inimigo a ser batido.

Essa aparente simplicidade carrega na sua gênese o esforço de um trabalho que tenta se estabelecer por meio das referências que as obras anteriores lhe delegaram. Ou seja, há sempre um traço no desenvolvimento do longa que nos remete diretamente a trabalhos de diferentes épocas.

Esse tom referencial, entretanto, surge dentro da diegese que Quantum os Solace estabelece por si mesmo. Ou seja, dentro do universo de onde a estória é contada. Não estamos falando de uma construção gratuita, mas de um fazer que vem das mãos de realizadores que entendem o universo das histórias de James Bond.

Há momentos de retomadas claras a filmes como 007 – Permissão para Matar (1989), Goldfinger (1964) e O Espião que me Amava (1977). Então, difícil desprestigiar um longa que concentra tanto bons antecedentes para a sua própria construção. Mas não somente por isso, e sim também por se pensar como uma sequência, se considerarmos o excelente Cassino Royale (2005). Diferentemente da quadrilogia interpretada por Pierce Brosnan (1995 – 2002), aqui os enredos se entrecruzam formando um todo de duas partes.

Isso é o que garante um ar muito mais sóbrio a Quantum of Solace. Como filme de gênero “ação”, ele está repleto de cenas de perseguição e lutas corpo a corpo. Mas toda essa construção faz parte de um projeto maior que é a franquia. Porque diferentemente dos filmes da “Era Brosnan”, Quantum se liga à série cinematográfica como continuidade. Isso é assumir a “responsabilidade” de entregar uma narrativa que assume o risco de ser parte de uma unidade, em detrimento do descompromisso de agir como um longa isolado.

Interessante notarmos igualmente o trato que as personagens tiveram a fim de que também não agissem como peças de apoio ao protagonismo exercido por Bond. Aqui, o herói não age como um ser autossuficiente. Ele precisa de seus aliados e juntos trabalham para a resolução dos conflitos os quais estão envolvidos. As próprias Bond Girls assumem um relevante papel de construtoras das situações que guiam a trama para sua resolução.

Sobretudo Camille (Olga Kurylenko), uma espécie de agente dupla não oficial, cujo arco dramático age em paralelo ao do próprio Bond. Ela deixa de ser apenas a “mulher fatal” para se assumir como protagonista do seu próprio arco dramático. Suas motivações são movidas tanto pelo desejo de vingança contra as pessoas que mataram sua família, quanto pelo dever de aniquilar as forças corruptivas que, dentro da trama de Quantum, oprimem a população da América do Sul.

Esse é o cuidado no desenvolvimento de personagens tão ricos que tornam o longa um bom trabalho no gênero de ação deste século. Há uma recorrente reclamação por parte da crítica e do público em relação ao já citado vilão Greene. De fato ele não é o mais bem construído e complexo de todos os que apareceram na Era Craig. Mas dentro do arco do próprio Bond, ele se encaixa como um dos elementos teste para a linha definição do nosso herói. Ele opta por neutralizar seu oponente a partir de outras vias.

E a veia exterminadora do 007 que já vinha sendo discutida desde Cassino Royale se cristaliza aqui. O agente entende seu dever e vai ao longo da trama de Quantum of Solace exercitando esse caráter menos impulsivo e mais racional em prol do completo êxito de suas missões. O clímax e consequente desenlaçasse do filme vem como causa disso. Ele não é anti climático, como muitos reclamam. Ele é o fechamento de um ciclo e o início de um protagonista com novas perspectivas, como vemos em Skyfall.

 

FICHA TÉCNICA

Título Original: Quantum of Solace

Tempo de Duração: 106 minutos

Ano de Lançamento (EUA): 2008

Gênero: Ação, Aventura, Thriller

Direção: Marc Foster

 

Daniel Araújo

Crítico de Cinema, Realizador Audiovisual, e Jornalista.

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