A verdade e as mentiras na conta da Previdência II, por Osvaldo Euclides

O governo e os jornalistas e economistas “de mercado” querem uma reforma da Previdência que, entre outras medidas, aumente a idade mínima para aposentadoria, alguma coisa igual ou acima de 65 anos. Ou seja, o trabalhador, seja executivo ou operário, seja homem ou mulher, independente do número de anos que já trabalhou e contribuiu, só poderia ter aposentadoria após 65 anos ou mais.

Pare por alguns instantes e reflita. Parece natural? Você ouviu algum economista, jornalista ou especialista em RH dizer que isso não é uma coisa razoável? Bem, vamos ver por que essa proposta é (ou parece ser) absurda, considerando as práticas do mercado.

Quem já ficou alguma vez desempregado, sabe que tem de preparar um currículo e submeter-se a processos de recrutamento e seleção. Os filtros são rigorosos, os profissionais da área são severos com os dados, com os fatos e com os números. Para que um currículo possa vir a ser avaliado com calma, ele passa por um crivo preliminar eliminatório quase automático que bota o olho em três coisas: a idade, a experiência e a formação.

Não é à toa que a idade é a primeira peneira. Ponha-se no lugar do contratante ou do selecionador. É claro que ele prefere alguém mais jovem, mais forte, mais vigoroso.

Evidente, que alguma experiência é muito útil, indispensável em muitos casos. E a formação completa a primeira peneirada. Quanto à experiência e formação, a peneira se molda à função e ao cargo que se pretende preencher.

A idade, não. A idade é quase inflexível. Ela é fixada meio arbitrariamente, sem muita reflexão, tem pouca relação com a função, costuma-se aceitar faixas de idade, é usual, mas fora delas não há salvação. Há limites que todos evitam cruzar, e os profissionais de seleção fazem isso sutilmente, porque não é legal alegar problemas de idade para uma seleção. É ilegal, mesmo, porque preconceituoso, além de desumano.

Vamos aos fatos: qualquer executivo sabe que depois dos quarenta e poucos anos, o mercado começa a fechar-se para ele. Os recrutadores torcem o nariz, olham de esguelha e botam o currículo de lado, literalmente, rejeitam o candidato. Depois dos cinquenta, nem pensar, só como exceção, e para funções, cargos e situações muito específicas, singulares mesmo.

Para os operários, é diferente? Para pior ou para melhor? Diga você mesmo, levando em conta que a juventude e o vigor são mais decisivos quão mais baixa é a hierarquia.

Então, como pedir a alguém que continue no mercado de trabalho depois dos 60 anos? Na verdade verdadeira, ele só chegará aos 60 anos no mercado de trabalho se depois dos quarenta e poucos conseguir consolidar-se e estabilizar-se numa empresa e numa função, o que, convenhamos, não é assim tão fácil e garantido.

Então, por que o governo, os jornalistas e os economistas defendem tão naturalmente uma proposta absurda, se considerarmos as práticas efetivas do mercado?

Diga você mesmo. São questões de princípio ou de interesse? Princípios e interesses de quem?

Fala sério, presidente.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.