A utilidade e a inutilidade da indignação, por Osvaldo Euclides

A indignação é um sentimento útil. Ela preenche a alma e enche o coração e dá ao homem a vontade de agir contra aquilo que a causa, para cessar o que é indigno, revoltante ou injusto.

No homem comum, no cidadão simples, desprovido de autoridade, posição ou poder, faz todo sentido a indignação, porque ele normalmente não tem como ir além dela. E se alguém não ultrapassa a indignação, e age, ela passa a ser objetivamente inútil.

A indignação, entretanto, não fica bem em certas pessoas, sobretudo naquelas que carregam alguma autoridade de função, que ocupam posições que lhes permitam agir e reagir ou dispõem do poder de propor, articular mudanças. Nessas pessoas, não raro, a indignação é rasa e falsa, termina funcionando mais como uma fuga de seus deveres e de suas responsabilidades.

Vamos a um exemplo.

A indignação não fica bem nos governantes (presidentes, governadores, prefeitos) se não for seguida imediatamente de algum ato ou providência formal contra a causa. Ou, se for o caso, de esclarecimentos porque não agiu a tempo de evitar o evento indigno ou revoltante. Ou ainda, se não está o caso sob sua alçada, dizer como vai articular-se com quem de direito para sanar a questão.

A indignação não fica bem nos parlamentares (vereadores, deputados, senadores) se não for seguida imediatamente de alguma proposta, projeto de lei ou, na pior das hipóteses, de um posicionamento político claro ou anúncio de articulação que possa resultar em alguma consequência prática a curto ou a médio prazo.

A indignação não fica bem em alguns profissionais (como, por exemplo, jornalistas) se não for seguida imediatamente de uma análise até a raiz mais profunda do problema, traduzindo para a sociedade o completo contexto do evento, relatando com clareza os antecedentes históricos, fixando os números e argumentos dos diversos ângulos do assunto (e não apenas um ou dois) e assegurando a continuidade do seu acompanhamento e o monitoramento permanente das pessoas e organismos que sobre ele tenham responsabilidade.

A indignação de algumas dessas pessoas de posição, autoridade e poder sempre soa como oportunista, sempre aparenta ser rasa e sempre demonstra algum tipo de fuga ou falsidade.

A vida pública é o desfilar constante e contínuo de fatos a serem explorados por governantes, parlamentares e jornalistas, principalmente. Todos eles, por dever de função, precisam todos os dias, todas as horas, agir e reagir a palavras, a eventos, a números, a fatos e circunstâncias. Deles se pode e se deve cobrar que vão sempre além da indignação. Devemos deles esperar que tenham coragem, competência e discernimento para ir além da indignação.

Que fique a indignação reservada apenas para o cidadão que é vítima impotente do que é revoltante, indigno e injusto. Até que essa indignação exploda dentro dele e ele decida que basta. E faça o que tem de ser feito, e ninguém fez.

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.