UMA CRISE SEM FIM, por Rui Martinho

A Lava Jato não tem fim. Uma investigação revela novos crimes, novos envolvidos. A sequência é interminável. Não se sabe o que acontecerá com os candidatos. Novas denúncias, prisões e condenações poderão surgir. O Legislativo e o Executivo são os alvos das investigações anunciadas, além das inesperadas e possíveis.

A maioria dos políticos está envolvida nos escândalos ou é solidária com os indiciados e condenados. A situação é grave e sem solução. A limpeza dos poderes políticos deveria ser feita pelos políticos. A democracia, porém, não tem defesa contra as maiorias corruptas, isto sugere uma crise de solução difícil.

Aristóteles (384a.C. – 322a.C.) descreveu os regimes políticos e as suas formas degeneradas. A monarquia tenderia a degenerar em tirania; a aristocracia penderia para a oligarquia; e a democracia decadente se tornaria um regime demagógico. Temos hoje uma onda de “populismo”, eufemismo para demagogia.

O Judiciário deveria ser a última trincheira de defesa da ordem jurídico-democrática. Não poderia, para tanto, usurpar o papel do Legislativo e do Executivo. Mas o que vemos é a judicialização da política e das relações sociais. O primeiro destes desvios resulta de um conjunto de fatores, entre os quais a “Nova Hermenêutica Constitucional”, que enfatizando conceitos indeterminados, tais como razoabilidade, equidade, dignidade humana e justiça, propugna por mais discricionariedade nas decisões judiciais, usando como escudo a positivação de princípios na Carta Política de 1988, a unidade do sistema jurídico, a hierarquia entre as normas e a interpretação sistemática. Em defesa da discricionariedade alegam assegurar o resguardo da segurança jurídica pela obrigação do magistrado fundamentar suas decisões, como se não fosse possível, com algum engenho e pouco escrúpulo, fundamentar qualquer coisa, a exemplo do que foi feito com o meio impeachment da presidente Dilma. O ativismo judicial é outro fator de politização do Judiciário. A fragilidade dos outros poderes é outro fator. Ocupar as lacunas da omissão do Legislativo outra desculpa. Mas o STF não é órgão supletivo do Legislativo e a omissão da Congresso é um veto tácito.

O STF age como junta governativa, um “tenentismo de toga”. Interrompeu uma sessão para vários ministros, inclusive a presidente da casa, proferirem discursos de protesto pelo assassinato de uma vítima com mandato político, mas dezenas de vereadores e prefeitos têm sido mortos sem o Pretório Excelso se manifestar. É óbvia a solidariedade com um tipo de ativismo, difícil de distinguir de exploração política.

Enquanto a França prende Sarkosy, o STF exige da sua presidente fazer uma sessão especial para mudar a jurisprudência (não entro no mérito da questão, mas na oportunidade da mudança subitânea), para salvar o Lula. Não cabe preocupação com a ordem pública depois do impeachment, da condução coercitiva e das duas condenações seguidas do Lula, nas duas primeiras instâncias, sem a menor repercussão.

Rui Martinho

Doutor em História, mestre em Sociologia, professor e advogado.

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Rui Martinho

Doutor em História, mestre em Sociologia, professor e advogado.