Trecho de artigo de Edemilson Paraná, doutorando de Ciências Sociais na Carta Maior em 28.06 sobre as eleições na Inglaterra, que deram ‘vitória’ ao trabalhista Jeremy Corbyn:
“…Mas cabe aqui, novamente, analisarmos essa intrigante trajetória à luz da situação dos eleitores mais jovens, a maioria entre que os optaram por Corbyn.
Pesquisas mostram que eles estão entre os mais tolerantes à presença de imigrantes, e entre os mais reticentes a vincular terrorismo ao Islã. São os mais favoráveis à manutenção do país na União Europeia, e os mais abertos a questões como diversidade racial e de gênero. Em geral menos sindicalizados, são os mais conectados às mídias sociais, entusiastas de novas tecnologias, e os mais preocupados com questões ambientais.
Qualquer partido disposto a conquistá-los teria focado seu programa sobretudo nestes pontos: na construção de um programa liberal-cosmopolita, ambientalmente preocupado e diverso em questões culturais e de costumes. Foi o que fez o partido Liberal Democrático. Para a surpresa de muitos, não funcionou. O partido manteve mais ou menos o mesmo tamanho que tinha antes da eleição.
Distintamente, os mais jovens (e não apenas eles) optaram por Corbyn e pelo Partido Trabalhista, que fez das condições gerais de vida e trabalho das maiorias sociais a questão central de debate: da melhora sistema de saúde à nacionalização de ferrovias, do fim das cobranças de taxas em universidade à taxação de grandes riquezas. Se questões como responsabilidade ambiental e diversidade de gênero e racial não foram ignoradas, tampouco foram colocadas no centro da agenda. O mesmo aconteceu com o Brexit e a saída do país da União Europeia.
Pode-se dizer, então, que, mesmo apostando fortemente no diálogo com os jovens e em uma forte estratégia de divulgação nas mídias sociais, Corbyn fez uma campanha socialdemocrata típica: centrada na construção do Estado de Bem-Estar e na melhoria das condições de trabalho. O resultado foi não só o apoio dos mais jovens e o crescimento do Labour junto ao eleitorado como um todo, mas a eleição de um dos parlamentos mais representativos em termos culturais, raciais e de gênero dos últimos anos. Para os que, em ambos os lados, vem argumentando distintamente, o caso da eleição no Reino Unido reforça uma forte vinculação ou interdependência das agendas de redistribuição econômica às de representatividade e reconhecimento político.
Talvez esteja aí um farol para esquerda em outras paragens: sem abandonar as questões relativas aos costumes, diversidade cultural e igualdade de gênero e raça, é hora de trazer de volta à agenda a incontornável centralidade das condições material de vida e trabalho. Engajar-se, ainda que sem negar a importância e complementariedade das demais agendas, em um debate fale diretamente para as angústias mais urgentes das maiorias sociais – o que não significa, naturalmente, ignorar os anseios das minorias políticas…”