SOMOS TODOS CAPITALISTAS NO SÉCULO XXI? Por Uribam Xavier

No século XXI, parece que chegamos ao fim da história. De forma consciente ou não, conduzimo-nos pelo pressuposto de que, com o fim da polaridade entre o bloco capitalista e o chamado “bloco socialista”, acontecido com o fim da Guerra Fria, se consolidou a vitória absoluta da racionalidade capitalista como única possível a guiar os destinos da humanidade. Nesse cenário, a utopia de transformação social como sinônimo de emancipação humana é vista como ingenuidade, pois estamos diante de uma epocalidade onde o capitalismo é absoluto, ou seja, é Deus [princípio e fim]. Assim, cabe aos governos ser o guardião dos interesses do capitalismo e administrar bem o sistema.


O mundo capitalista do século XXI se divide entre os capitalistas neoliberais e os capitalistas neodesenvolvimentistas. Para os neoliberais, é preciso ter um Estado forte com capacidade de intervir para garantir o seu próprio funcionamento em suas funções mínimas, o livre mercado, e salvar o setor privado [bancos, empresas e os rentistas] das crises criadas pelo próprio capitalismo. Para os neodesenvolvimentistas, o Estado tem que ser forte para intervir regulando o mercado, evitando que ele produza efeitos perversos, para que possa ser compensador das desigualdades regionais, sociais, culturais e menos destruidor do meio ambiente. No século XXI somos todos capitalistas, mas não somos mais governados pela “mão invisível do mercado” de Adam Smith. No processo de financerização da economia, o Estado funciona como lastro para garantir a reprodução especulativa do capital; não se trata mais de um Estado keynesiano, do pós-guerra, que intervinha na economia para gerar emprego e produtividade, mas de um Estado que intervém para garantir a transferência de riqueza para os rentistas.

O movimento globalizado de produção e reprodução do capital nos oferece, na segunda década do século XXI, uma conjuntura de instabilidade e insegurança, nos contextos regionais, entre países e no interior dos países. A materialização dessa instabilidade e insegurança aparece efetivada nas formas de ações terroristas, nos conflitos armados em várias partes do mundo, no aumento da violência e da pobreza, nas práticas de genocídios, no número de refugiados espalhados pelo mundo, nos conflitos religiosos, nas práticas de limpeza étnicas, nas questões de ordem climáticas e na crise de representatividade das instituições políticas [parlamentares, partidos e os poderes executivo, legislativo e judiciário].

Chegamos ao século XXI numa situação em que ser de direita ou de esquerda passou a ser um ethos político, ou seja, uma maneira de ser e estar com e no capitalismo. Ou se é direita capitalista neoliberal ou esquerda capitalista neodesenvolvimentista. No Brasil, desde o fim do governo de Fernando Henrique Cardoso que convivemos com essa polaridade entre os que se candidatam para administrar o capitalismo no país: PSBD, como articulador do bloco neoliberal; e o PT, como articulador do bloco neodesenvolvimentista. Ambos são conservadores, ao se contentarem em defender ou administrar bem o capitalismo, ao renunciar a buscar alternativa sistêmica, ao não acreditarem que um outro mundo é possível.

Em nossa epocalidade, não é tão adequado falar em países desenvolvidos e subdesenvolvidos. Em cada país, a concentração de riquezas gera segregações que dividem o território nacional em regiões ricas e pobres, bairros de bacanas [bilionários, milionários], bairro de classe média e favelas que aglutinam pobres e miseráveis. Existe subdesenvolvimento nos Estados Unidos, na Inglaterra e na África do Sul convivendo com gente que não sabe precisar o quanto acumula ou como gastar o que concentrou em suas mãos. Não podemos simplesmente falar países pobre e países ricos, pois pobreza e riqueza estão presentes em qualquer lugar do planeta capitalista. Somos todos capitalistas. Assim, os diferentes processos de integração econômica são intervenções que marcam as disputas de interesses geopolíticos na condução do capitalismo no planeta terra. Nesse contexto, me junto aos que, feito salmão na piracema, nadam contra corrente.

Uribam Xavier

URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.

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Uribam Xavier

URIBAM XAVIER. Sou filho de pai negro e mãe descendente de indígenas da etnia Tremembé, que habitam o litoral cearense. Sou um corpo-político negro-indígena urbanizado. Gosto de café com tapioca, cuscuz, manga, peixe, frutos do mar, verduras, música, de dormir e se balançar em rede. Frequento os bares do entorno da Igreja de Santa Luzia e do Bairro Benfica, gosto de andar a pé pelo Bairro de Fátima (Fortaleza). Escrevo para puxar conversa e fazer arenga política.