Lendo sobre minha nova paixão, que só perde para a Ciência Política e deixa minhas raízes jurídicas guardadas dentro de um baú, vejo as anotações de Karina Kuschnir sobre a função da antropologia da política e a tentativa dos antropólogos de desvincular a noção de política da existência de instituições que tradicionalmente, no mundo moderno, a viabilizam.
Os mais radicais questionam a existência do Estado, mas há os que se atrevem a procurar novos meios de exercício da política que coexistam ou passem ao lado de tais instituições. Mas essa reflexão passa, necessariamente, pela vontade do indivíduo simples, aquele que pega o ônibus lotado e paga em dia seus impostos – mesmo contrariado, de fazer política.
Me pergunto, nesse sentido, por que a necessidade de criar uma associação para defender os interesses de um bairro pequeno, interesses estes que estavam na plataforma eleitoral dos últimos vereadores eleitos. Constaram nos discursos e nas visitas domiciliares feitas por quase todos os candidatos e vieram antes do aperto de mão e daquele olho no olho que os pseudo comprometidos dizem valorizar. Já se vão oito meses da posse dos últimos vereadores eleitos e não se vê, de modo concreto, melhoria na vida daquela comunidade. A cidade tem melhorado, mas, e nós? Diz o indivíduo que foi assaltado semana passada.
Esses interesses são os mesmos do bairro vizinho que, separado por uma rua, já possui uma associação que, por sua vez, se deixa utilizar por interesses imobiliários em troca de um pouco de atenção para os seus moradores. Querem, os moradores: segurança, melhores escolas, opções de lazer para suas crianças e jovens, saúde, atenção desvinculada do pedido de voto. Querem, os moradores, a certeza de que não são apenas um número na hora da contabilização dos votos.
E a associação será criada por aqueles que num arroubo de civilidade pensaram que o nome no papel mudaria a realidade do bairro, traria segurança para a esquina perto da sua casa e iluminação para aquela rua em que anda toda noite quando desce do ônibus lotado. As vontades são muitas, os interesses também e as necessidades variam de casa pra casa, mas passam por pontos em comum, já que repetem o que prescreve a Constituição Federal como sendo direitos sociais destinados como tais a todos os brasileiros.
Voltamos ao ponto inicial. No papel temos direitos, temos a quem recorrer, somos um corpo de eleitores. Na vida real temos pedidos, aguardamos na sala de espera, somos gente.
Adriana Soares Alcântara
Técnica Judiciária do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará
Especialista em Processo Civil e Direito e Processo Eleitoral
Mestranda em Planejamento e Políticas Públicas da UECE/ESMEC
cel (085) 988885917