Precisamos falar de QSP. Isso interessa a você e à sua família?! por Osvaldo Euclides

A quem interessa a qualidade do serviço público?

Os banqueiros e os magnatas do mundo empresarial se preocupam com a qualidade da gestão pública. Eles sabem com plena clareza que seus interesses diretos e imediatos estão em jogo. Efetivamente eles não se ocupam nem se preocupam com a saúde, a educação e com o transporte público. Eles não os usam, porque deles não precisam, e deles querem distância. Sua atenção fica cem por cento focada na gestão da taxa de juros, na administração da taxa de câmbio e, por último mas não menos importante, na política fiscal. Uma mudança brusca na taxa de câmbio (e chamo de brusca toda mudança, digamos, “não coordenada” pelo mercado) ou na trajetória dos juros pode lhes custar fortunas. Quanto à política fiscal (receitas e despesas públicas), qualquer déficit mais volumoso ou mais continuado pode afetar a capacidade do governo de pagar juros ou levá-lo a instituir a cobrança de mais impostos. Todos os outros empresários de médio e até de grande porte têm, em princípio, a mesma preocupação central. Varia apenas o grau de consciência e controle.

A alta burocracia (juízes, desembargadores, procuradores, parlamentares, funcionários públicos bem situados nas “carreiras de Estado”, antigos funcionários de estatais, entre outros) também não são usuários dos serviços básicos, mas, como são privilegiados em suas posições e em suas remunerações e vantagens diretas e indiretas cuidam, sem muito engajamento, de manter o Estado e a gestão da máquina pública em inércia, sem mudanças, o bastante para não lhes afetar, não lhes incomodar.

A classe média alta preocupa-se muito pouco com a qualidade dos serviços públicos. A maioria já colocou e mantém seus filhos na escola particular e resolve-se fora do SUS com seus planos de saúde privada complementar. Quase todo membro adulto da casa já tem carro. Mora em condomínio fechado de muros altos, com cercas elétricas e vigias particulares.

Entretanto, a grande maioria dos brasileiros, digamos cento e cinquenta entre os duzentos e cinco milhões, está fora das classificações acima. São os cidadãos comuns das classes C, D e E. Crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos, de renda modesta, todos são afetados direta e profundamente, homens e mulheres, pobres ou remediados, de qualquer nível de instrução, morem eles na áreas chiques, na periferia ou na zona rural. Eles usam e dependem dos serviços de saúde, educação e transporte públicos (sem falar na iluminação pública, coleta de lixo, trânsito e segurança). A família toda é afetada de forma direta pela qualidade do serviço público. Essa qualidade afeta-lhes o presente e compromete-lhes o futuro, mesmo que não percebam, define-lhes a qualidade de vida numa correlação direta, contínua, permanente.

Na verdade mais verdadeira e profunda, todos os que aqui ainda moram, ricos, milionários, remediados e pobres, são afetados pela qualidade dos serviços públicos. Uns mais, outros menos. Uns diretamente, outros indiretamente. Uns agora, outros amanhã. Exemplos evidentes disso são as epidemias de dengue, zika e chicungunha, que desconsideram os “pedigrees” e as declarações de Imposto de Renda, e ameaçam a saúde de todos. Ou da escalada da violência, que lhes ameaça a vida, que não deixa livres nem os que andam de carro blindado ou de helicóptero, porque em algum momento, alguém da família tem que botar o pé no chão.

A questão é o que cada um faz ou deixa de fazer para defender seus interesses e proteger a sua qualidade de vida e de sua família. Como todos são atingidos pela questão, o natural seria esperar que todos se unissem e juntos lutassem para conquistar melhorias.

Bem, de todos esses brasileiros os que mais cuidam da gestão pública e melhor protegem seus interesses são os banqueiros e magnatas. Por isso querem os mercados longe das mãos da política. Eles precisam controlar diretamente o Banco Central e o Ministério da Fazenda, assim controlam o que lhes interessa (juros, câmbio e política fiscal).

Uma boa parte dos membros da classe média alta e da alta burocracia não se envolve e não se engaja em qualquer ação mais significativa para melhorar o serviço público. Basta observar o Poder Judiciário e ver como agem seus membros e como nada de positivamente relevante acontece por lá. Alguns apenas toleram o país em que nasceram e já estão mandando seus filhos estudarem (e morarem) no exterior.

Quando a união seria decisiva para se obter melhorias, infelizmente, parece que quase todos desistiram de se unir e lutar por serviços públicos de qualidade.

Mas, o problema brasileiro é ainda mais grave e dramático. Sequer medimos e gerenciamos a qualidade do serviço público. O Brasil e os brasileiros, rendemo-nos ao estigma de que o serviço é ruim, muito ruim, e não adianta lutar, porque nunca, nada vai melhorar.

O Brasil já viveu um problema tão grave e tão dramático quanto este por décadas. Um problema intolerável perturbou a vida brasileira. Parecia impossível derrotá-la. Houve tentativas, houve fracassos. Mas, ao final, o Brasil a venceu. Todos os que têm um pouco mais de idade sabem como a inflação parecia impossível de ser domada. E foi vencida. Para alguns com grande sacrifício, mas foi.

Precisamos falar de QSP. Isso interessa a você?!

Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.

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Osvaldo Euclides de Araújo

Osvaldo Euclides de Araújo tem graduação em Economia e mestrado em Administração, foi gestor de empresas e professor universitário. É escritor e coordenador geral do Segunda Opinião.