Trecho da entrevista – Publicado no Jornal Extra Classe.
Economista, professor e um dos mais respeitados pesquisadores sobre a concentração de riqueza no mundo, Antonio David Cattani está lançando um novo livro. Em Ricos, podres de rico (Tomo Editorial, 64 páginas), disseca de forma didática e acessível – “sem economês”, salienta – como o aumento da riqueza nas mãos de poucas empresas ou pessoas é um risco à democracia, além de uma ameaça ao próprio capitalismo.
Extra Classe – O senhor estuda a concentração de riqueza nas mãos de poucas pessoas há pelo menos dez anos. A que conclusões chegou nesse período?
Antonio Davi Cattani – Meu argumento é que a concentração de renda com a existência de multimilionários é nefasta para a economia e para a democracia. Para a democracia parece evidente, gera corrupção, tráfico de influência. Mas na economia persiste uma discussão sobre a importância de se acumular riqueza antes de distribuí-la. Em outras palavras, a tese de que a concentração de renda criaria mecanismos de maior eficiência econômica para investimentos produtivos que gerassem mais empregos e oportunidades. Bem, dez anos depois posso afirmar que isso é uma falácia. Uma mentira deslavada. Um discurso dos ricos, que querem apenas justificar seus rendimentos e seus privilégios.
EC – Não se trata de um fenômeno do capitalismo brasileiro?
Cattani – Não, de jeito nenhum. Em nenhum capitalismo, em nenhum lugar, a acumulação volta para a sociedade. Em outro livro (A Riqueza Desmistificada, 2007) eu analiso a situação dos Estados Unidos, onde há uma redução de impostos para os mais ricos, desde o primeiro governo de Bill Clinton (a partir de 1993) até o Barak Obama. Mostro ali que, ao contrário do que justificam os teóricos da concentração, não há mais investimentos, mas apenas mais especulação, o que gera instabilidade econômica e mais consumo de produtos de alto luxo, iates, jatinhos, viagens ao espaço. Os podres de rico têm tanto dinheiro que em determinado momento surge a seguinte questão: investir mais para quê? Para se incomodar contratando mais gente? Se eu posso ganhar dinheiro, muito dinheiro, com isenções, com privilégios fiscais? No caso brasileiro, que você menciona, o agravante é que a concentração de riqueza permite comprar, entre outras coisas, o próprio Congresso. Dou o exemplo da JBS, que investiu milhões de reais, centenas de milhões de reais, em todos os partidos, por uma razão bem objetiva: defender seus privilégios. Os bancos, a indústria farmacêutica, o ensino particular, o agronegócio, todos usam essa estratégia. Isso é um atentado à democracia.