Nestes primeiros 30 dias do ano, em meus momentos de distração, assisti a um vídeo de um graduando em Direito cujo tema era fazer justiça. Assim pensei em escrever algumas poucas linhas, para continuar a costura das minhas reflexões para entender o tempo presente.
Em primeiro lugar, para fazermos justiça precisamos ter o olhar do coração – o coração é aquele comandante da inteligência, como tão bem assinala o psicanalista e educador Rubem Alves – voltado para o Mistério que habita cada um e todos nós, cuja luz há de ser percebida também no rosto de cada ser humano ao nosso redor. O terceiro princípio da revolução democrática, a fraternidade, tem como origem etimológica o vocábulo latino germanus cujo significado é “aqueles que possuem o mesmo gérmen, a mesma origem humana”. No espanhol germanus originou a palavra hermanos e em português, irmãos.
Como decorrência desta primeira decisão interior é preciso desenvolver a capacidade de sentir o outro como um alguém que faz parte de mim, por pertencermos à mesma humanidade. Esta atitude nos permite o aprendizado da compreensão de suas alegrias e de seus sofrimentos, para intuir os seus anseios e buscar remédio às suas necessidades, oferecendo-lhe uma verdadeira atitude de justa medida pela qual ele espera.
Portanto, trata-se de cultivar a capacidade de ver antes o que há de positivo no outro, para acolhê-lo e valorizá-lo.
Por fim, para fazer justiça é necessário saber “criar espaço” para desenvolver uma reciprocidade humana que nos capacite a carregar “os fardos uns dos outros”, rejeitando as facilidades egoístas que sempre nos insidiam e geram competição destrutiva, arrivismo, suspeitas, ciúmes, ódio, injustiça. Sem uma educação da nossa sensibilidade em relação ao outro, como uma verdadeira caminhada ética que envolva toda a complexidade da vida humana, de pouco servirão os formalismos exteriores do direito. Revelar-se-iam mais como “estruturas sem alma”, do que como vias para a sua expressão e crescimento.
Como diz um pensamento antigo, para fazer justiça precisamos, antes, retirar as traves que existem em nosso olhar (agir), para somente depois podermos enxergar bem – com o coração e com a mente – os ciscos que habitam o olhar (agir) do outro. É uma dimensão epistemológica e antropológica a qual o mundo pós-moderno está a requisitar urgentemente.