Ecoanarquistacatimbozeiro, você sabe o que é? Oswald Barroso explica

Ele vem de família classe média, filho de Antônio Girão Barroso – poeta modernista, jornalista e professor e de dona Alba Cavalcante Barroso, também professora. Entre doze irmãos, um menino que queria ser poeta ou, quem sabe, ser um pintor (e foi), ou até mesmo um esportista, mas ele confessa; eu era magrinho demais para ser um jogador. O teatrólogo e doutor em Sociologia Raimundo Oswald Barroso teve uma infância cheia de peraltices no centro de Fortaleza, fosse brincando com o velocípede na rua Pedro Pereira ou nas matinês de domingo do então Cine Rex, na rua General Sampaio. Passou por momentos alegres e repletos de poesia na adolescência, até momentos emblemáticos e tristes como o incidente que determinou o fim da sua trajetória esportiva e o seu início na vida intelectual. Para pagar uma promessa, a mãe escolheu o nome Raimundo. Já Oswald, foi homenagem do seu pai, que era um admirador do poeta Oswald de Andrade. Na quarta edição o Perfil HQ traz um pouquinho mais daquele que é conhecido como o desbravador da história da cultura popular do Ceará e se define como Ecoanarquistacatimbozeiro. Vamos descobrir?

 

  1. Eu gostaria de ter vivido antes da chegada dos portugueses no Brasil, entre os índios Tabajaras, na serra da Ibiapaba, para ajudar a organizar a resistência contra os invasores.


  2. A palavra que eu mais gosto é mãe, porque traduz aconchego, e a que menos gosto é senhor, porque lembra senhor de engenho e de escravo.

  3. Um filme para ver de novo é O Abraço da Serpente, do colombiano Ciro Guerra, que mostra o universo maravilhoso da civilização amazônica, destroçada pelos europeus.

  4. Politicamente, eu sou ecoanarquistacatimbozeiro, por ter uma visão biocêntrica do universo, defender a fragmentação do poder, e ver na religiosidade indígena com seus caboclos, enquanto entidades ligadas às forças da natureza, a melhor maneira de cultuá-la.


  5. Eu ressuscitaria o Beato José Lourenço, do Caldeirão da Santa Cruz do Deserto, por seu espírito pacífico e comunitário.

  6. O livro que já li várias vezes foi Pedro Páramo, de Juan Rulfo, escritor mexicano, que foi um dos precursores do realismo fantástico latino-americano.
  7. Eu me acalmo com o sorriso das crianças, o carinho dos animais e a mansidão dos sábios.


  8. Eu me irrito com a vaidade, a soberba e o autoritarismo.

  9. A emoção que me domina é o enternecimento quando encontro a poesia no cotidiano.
  10. Um dia ainda vou terminar o grande romance épico que comecei a escrever, reunindo histórias vividas e ouvidas, ao longo dos últimos 68 anos.

  11. Existem muitos heróis, principalmente anônimos. O meu herói favorito é o cearense Tristão Araripe, herói de três revoluções 1917, 1922 e 1924, conhecido como Alma Afoita da Revolução.

  12. Religião para mim é aproximação com o divino e aperfeiçoamento espiritual sem dogmas, autoridades terrenas ou fanatismos. No mais é imposição e engodo.

  13. Dinheiro é fonte de exploração, opressão e destruição.

  14. A vida é uma grande aventura, que nos desafia a todo instante, por isso nos mantém ligados, mesmo na dor.

  15. Se eu tivesse o poder, mudaria o próprio poder, implantaria a impossibilidade da concentração de poderes, com sua fragmentação.


  16. Eu gostaria de ser poeta, somente poeta, vivendo de brisa, como se diz.


  17. Não perco uma oportunidade de criticar o antropocentrismo como uma manifestação do egoísmo da humanidade.

  18. A solidão e o silêncio são alimentos da alma, necessários para a reflexão e para a paz de espírito.
  19. O Brasil é um paraíso decaído.

  20. O ser humano vai autodestruir-se, se não estancar a sangria que provocou no corpo da Terra.

  21. Eu sou, como se diz, uma alma ativa no mundo, minha mensagem é: busque seu caminho, junto com os seus, deles não se aparte, afirme o que você acredita, corrija seus erros e viva plenamente.

O poeta passeou também pelo mundo da música como letrista e violinista amador. Dentre os mais de 25 livros publicados estão o Almanaque Poético de uma Cidade do Interior (1982), Reis de Congo – Teatro Popular Tradicional (1997), Memória do Caminho (2006), Dormir Talvez Sonhar (2007) que, como disse Gilmar de Carvalho, “traz do cordel a agilidade da fala que não se deixa represar”, e Entre Ritos, Risos e Batalhas (2011). O autor escreveu diversos textos para teatro, alguns são A Irmandade da Santa Cruz do Deserto (1987),  Corpo Místico (1997), Auto do Caldeirão (2004) e A Farsa do Diabo que queria ser gente (2011).  

O folclorista com a mansidão dos sábios  surpreende não só pelo saber acadêmico de professor, poeta, jornalista e com vasta obra no teatro, referência para todos os interessados pelo tema, mas principalmente com o saber mágico, mítico e anímico do mundo da cultura popular. O olhar de quem vê e enxerga, ele encontra  poesia no cotidiano, Oswald vivenciou os porões da ditadura, mas não se afogou em amarguras do passado, fez disso Arte,  imprimiu no papel e permitiu que a infância solta e feliz prevalecesse dando origem a uma sensibilidade extraordinariamente viva.

Confira entrevista completa com Oswald Barroso no nosso canal no Youtube.

 

Heliana Querino

Heliana Querino Jornalista

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Heliana Querino

Heliana Querino Jornalista

2 comentários

  1. Parahyba de Medeiros

    Não precisa ser um sábio, cientista social, especialista em grandes coisas para saber q o planeta está num momento crucial. As crianças sabem disso. Diante do planeta agonizante os gestos e atitudes de grande parte da humanidade contribui para a superação da catastrófica situação. O pro é que existem os “pau-de-lata” que se atravessam no caminho da construção de uma nova mentalidade. Indivíduos tapados emocionalmente, porém inteligentíssimos em manipulação e habilidades em escalada de poder centralizador. Neste cotidiano de barbárie, a existência de figuras tais como Mujica e Papa Francisco inspira a revolução por uma nova Terra. Aqui mais perto da gente, temos Oswald Barroso, exemplo de incansável parteiro, fazendo a toda hora suscitar poesia e trazendo luz para o bem viver coletivo.