Em seus estudos sobre a democracia, o liberal Alexis de Tocqueville dedica um capítulo inteiro sobre a liberdade de expressão de todos os cidadãos e cidadãs, compreendendo-a como um fundamento básico para a construção de uma ordem democrática viva e pulsante. A soberania de um povo e a liberdade de expressão são, na sua concepção, duas coisas inteiramente correlativas. Na democracia, os raios das opiniões e da inteligência humana, em vez de partirem de um centro comum, devem cruzar-se em todos os sentidos, oriundos dos mais diversos pontos de vista. Sendo assim, o único meio para neutralizar a centralização da notícia nas mãos de alguns poucos donos da mídia é a multiplicação de espaços capazes de exprimir no mesmo nível a circulação das ideias e das interpretações dos fatos. Tocqueville alerta para o fato de a palavra de um pequeno grupo de homens poderosos e articulados, que penetra os diversos ambientes, as mentes, os corações de uma população, tem muito mais poder do que os gritos difusos de mil oradores impossibilitados de terem acesso a meio eficazes de comunicação. Contra o poder de uma mídia concentrada que publica suas interpretações dos fatos de forma seletiva e segundo seus interesses, torna-se fundamental garantir a construção de diversos espaços públicos de comunicação que sirvam de antídoto ao monopólio midiático.
A liberdade de pensamento e de ação está na base da liberdade de expressão. Segundo o autor, não há grandes povos sem a ideia de direitos humanos, afinal o que é uma reunião de seres humanos e racionais cujo único vínculo é a força, seja ela econômica ou midiática? Opressão. Assim, a tarefa da defesa e da ampliação dos direitos humanos não se improvisa, dá-se no dia a dia, como bem lembra Bertold Brecht: imprescindíveis são aqueles que lutam durante toda a vida. Portanto, não se trata apenas de produzir leis e obedecê-las, mas principalmente do poder presente de produzirmos novas leis que atendam às nossas necessidades humanas de hoje e de amanhã, cujo horizonte norteador seja a liberdade e a igualdade entre cidadãos e cidadãs. Para o autor a chave está na participação política como o meio mais poderoso de interessar homens e mulheres pela sua sorte e a sorte da sua coletividade. A conquista dos direitos humanos é inseparável do exercício da cidadania.
Num mês recheado de fatos que merecem uma reflexão particularizada (coisa que não temos condições de realizar nesse exíguo espaço), como a agressão policial sofrida pelos professores do Distrito Federal no dia 28 de outubro na manifestação que realizavam pelo dia do funcionário público; o crime de lesa-humanidade perpetrado pelo rompimento da barragem da mineradora Samarco, em Mariana – MG; as reações beócias de parte do setor conservador brasileiro em torno do tema da redação do ENEM 2015; a decisão judicial que inocentou o policial que assassinou a queima-roupa a criança Eduardo de Jesus em sua residência no Complexo do Alemão; resolvemos destacar a aprovação do projeto de lei de autoria do senador Roberto Requião (PMDB – PR) que garante o direito de resposta ou retificação do ofendido por matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social, por entendermos que é uma novidade que amplia nosso horizonte democrático na luta por mais direitos e justiça.
Como lembra o sociólogo José de Sousa Martins, no Brasil as construções positivistas republicanas tentaram sempre “civilizar” a nova nação capitalista, tentando renegar o passado escravista. Por essa razão, a realidade complexa da escravidão, com suas consequências, suas expressões sócio-culturais e sua memória foram colocadas à margem da sociedade que se buscava imaginar e edificar. Ao invés de tentar solucionar o déficit social criado pela colonização escravista, os políticos nacionais, em nome do progresso e do lucro capitalista, relegaram para a marginalidade e para a pobreza os homens e mulheres comuns desta nação. Pobreza econômica, cultural e política.
Entretanto, desde 2003 uma nova etapa de nossa democracia despontou no horizonte, procurando combater o caráter excludente sobre o qual se alicerçou a história de nossa construção como nação. Uma das mais evidentes exclusões nesse processo secular é a falta de acesso aos espaços de comunicação social. Com certeza, a conquista do direito de resposta virá a somar na redução do poder concentrado dos meios de comunicação nacional. Trata-se ainda de uma luta de Davi contra Golias, mas, como atesta a história, com os meios e estratégias eficazes o anãozinho conseguiu vencer a batalha contra o gigante. A luta continua.